Bancada ruralista
na Câmara dos Deputados comemora e Ministério Público critica
Uma portaria
editada pelo Ministério do Trabalho e publicada nesta segunda-feira
(16/10/2017) traz regras que dificultam o acesso à "lista suja" de
empregadores flagrados por trabalho escravo no País. De acordo com a nova
portaria, a lista com o nome de empregadores autuados por submeter
trabalhadores a situações análogas à escravidão passará a ser divulgada apenas
com "determinação expressa do ministro".
Entre as medidas, está a necessidade de que o auditor fiscal seja acompanhado,
na fiscalização, por uma autoridade policial que deve registrar boletim de
ocorrência sobre o caso. Também é necessária a apresentação de um relatório
assinado pelo grupo de fiscalização e que contenha, obrigatoriamente, fotos da
ação e identificação dos envolvidos.
A portaria também
traz novos conceitos de trabalho forçado, jornada exaustiva e condição
degradante, incluindo, para que haja a identificação destes casos, a ocorrência
de "privação da liberdade de ir e vir" - o que não constava nas
definições adotadas anteriormente.
A promotora do MPT-PR (Ministério Público do Trabalho no Paraná), Cristiane
Maria Sbalqueiro Lopes, classificou a portaria como uma "Lei Áurea às
avessas". "É um mito achar que a privação da liberdade é inerente ao
trabalho escravo. Não é assim que funciona", afirma.
Segundo ela, o que obriga o cidadão a trabalhar e restringe a liberdade de uma
pessoa não é apenas o temor de levar chibatada, de levar uma bala. "Dizer
que agora para se caracterizar como trabalho escravo tem que ter alguém
vigiando, impedindo alguém de sair, é como jogar fora todo o trabalho que vem
sendo realizado", critica. "É óbvio que ninguém vai pagar pistoleiro
para vigiar o trabalho escravo, porque isso sai caro. Os interessados em
escravizar utilizam outros ardis para impedir que as pessoas fujam sem ter que
pagar feitor", argumenta.
Sobre a exigência de "determinação expressa do ministro do Trabalho"
para a divulgação da "lista suja" a promotora crítica: "Essa
questão da divulgação da lista suja, o governo vem fazendo corpo mole para
publicá-la. Por que a lista suja é tão combatida? Porque quando se coloca o
nome de uma pessoa ou de uma empresa na lista faz-se com que outras corporações
se afastem porque quem está na lista não apresenta postura correta. Além disso,
quem está na lista suja não recebe financiamento público ou privado",
aponta.
No Paraná, segundo
ela, há situações de trabalho escravo no agronegócio, em culturas sazonais,
como na colheita da mandioca ou na colheita de erva mate. "Como esse
trabalho dura de dois a três meses, as pessoas ficam com preguiça de fazer
alojamento, de fornecer água, de pagar salário justo, de registrar o
trabalhador na carteira de trabalho", critica.
Lopes explica que,
no campo, é mais fácil de isso acontecer. "Mas o trabalho escravo também
ocorre na área urbana, no setor têxtil, na construção civil e nos
frigoríficos", exemplifica.
A promotora
denuncia um "desmonte" da fiscalização do Ministério Público do
Trabalho. "Eu estou há menos de um ano no MPT e desde então não tem
diárias para hospedagem e não tem gasolina para os veículos fiscalizarem",
expôs.
BANCADA RURALISTA
A medida, que atende aos interesses da bancada ruralista, ocorre em meio à
análise da nova denúncia na Câmara dos Deputados contra o presidente Michel
Temer. Integrante da bancada ruralista, o líder do PSD na Câmara, deputado
Marcos Montes (MG), elogiou o decreto, que, segundo ele, era uma demanda antiga
do setor. "O decreto constrói uma questão mais clara sobre a definição do
que é trabalho escravo. A lista agora não vai mais poder ter excessos",
afirma.
OUTRO LADO
Em nota, o Ministério do Trabalho diz que a portaria "aprimora e dá
segurança jurídica à atuação do Estado Brasileiro, ao dispor sobre os conceitos
de trabalho forçado, jornada exaustiva e condições análogas à de escravo",
usados para concessão de seguro-desemprego ao trabalhador que vier a ser
resgatado e para inclusão do nome de empregadores no cadastro da lista suja.
Diz ainda que o
combate ao trabalho escravo "é uma política pública permanente de Estado,
que vem recebendo todo o apoio administrativo desta pasta, com resultados
positivos concretos relativamente ao número de resgatados, e na inibição de
práticas delituosas dessa natureza, que ofendem os mais básicos princípios da
dignidade da pessoa humana".
Fonte: Folha de Londrina