Para
empreender é preciso conhecimento, capital e rebeldia. Englert é CEO da StartSe
e investidor direto em mais de 10 startups de vários segmentos
Três coisas mudaram de forma muito intensa nos últimos anos:
a forma como aprendemos, como investimos e como fazemos gestão. São técnicas
cunhadas há 30, 50 anos, em um cenário previsível, pouco dinâmico e no qual o
cliente não tinha poder, mas que continuam sendo repetidas hoje, mesmo que o
mercado seja o inverso: rápido e incerto. "No passado, ser conservador era
virtude, hoje é certeza de que vou morrer rápido", aponta Pedro Englert, CEO da
StartSe, empresa de educação para a nova economia. Empreendedor experiente -
foi ex-sócio da InfoMoney e XP Investimentos e hoje investe diretamente em mais
de 10 startups de vários segmentos - ele é o personagem do episódio desta
semana da Série Mentes Transformadoras.
Com a queda das barreiras de empreendedorismo, ficou muito
arriscado ficar parado. A concorrência vem de todos os lados e os clientes
ganharam poder - e estão mais dispostos a experimentar se for para ter ao seu
lado novas empresas que entendem mais a dor deles do que as grandes marcas. "Se
as companhias mais tradicionais não conseguirem mudar a sua forma de gestão,
estarão fadadas a ficar em um processo conservador de ganhos incrementais e
apenas aguardando pois, em alguma hora, alguém vai entender que dá para fazer
melhor que o que elas estão fazendo", analisa.
Para isso não acontecer, Englert comenta que é preciso
começar a mudar já. Um caminho é quebrar as hierarquias, entender que a
experimentação deve ser incentivada e que o erro faz parte do processo - não o
erro pelo relaxamento, e sim o da busca pelo novo. Construir os negócios lado a
lado com os colaboradores é um bom começo. "Temos que dar liberdade. Ninguém
mais quer trabalhar para o patrão.
Eu quero trabalhar para mim e entender como realizo os meus
sonhos aqui dentro (da empresa)", comenta. Neste cenário, o modelo de gestão
tradicional, que envolve planejamento, comando e controle, não funciona mais.
"Ao controlar, você inibe, tira a força e o ímpeto das pessoas. Temos que
conseguir trazê-las para perto, alinhá-las com os nossos projetos e empreender
juntos", acrescenta. Também é importante abrir ao máximo a pista para as
pessoas que estão arriscando, inovando e tentando transformar o mercado. "Nunca
foi tão possível empreender. O mundo está muito legal e aberto para a gente
correr atrás dos nossos sonhos, dos nossos propósitos e mudar todas as coisas
que estão ruins", afirma.
Englert comenta que um ecossistema empreendedor, seja uma
pessoa ou uma empresa precisa ter três componentes: capital, conhecimento e
rebeldia. Neste sentido, a maturidade é muito importante para o sucesso de uma
startup. "Por mais que um jovem de 22 anos seja genial, ele tem ainda pouco
conhecimento, vivência e prática", analisa.
A universidade de Harvard fez um estudo que indica que 42
anos é a idade que a pessoa que empreende tem mais chance de dar certo,
justamente porque é quando ele consegue reunir aqueles três elementos para o
sucesso. "Quando a gente pega uma turma muito jovem e coloca para empreender,
eles têm uma desvantagem em relação ao mercado porque têm pouco conhecimento.
Por isso a diversidade é tão importante. É preciso entender que experiências
diferentes têm de ser somadas para fazer o negócio dar certo", aconselha.
Preocupação
com o Brasil
Apesar de ver iniciativas de empresas querendo mudar, de
investimentos entrando, novas formas de educação surgindo e de reguladores
pensando em flexibilizar mais o mercado, o empreendedor afirma que tem muita
preocupação com o posicionamento do Brasil. "Hoje não tem praticamente
nada feito aqui e que está sendo usado no mundo", avalia.
Um legítimo cidadão do mundo, já que os negócios da StartSe
tem ramificações pelo Brasil, especialmente São Paulo, e também nos Estados
Unidos e China, ele observa atentamente os movimentos que estão acontecendo no
Rio Grande do Sul, onde nasceu. Para ele, por aqui, uma preocupação adicional é
o conservadorismo do gaúcho e, em alguns momentos, a falta de capacidade de
convergir. "O gaúcho ainda acha que brigar é bom. Mas nesse mundo, para
sobreviver, temos que compor, encontrar pontos comuns, abrir mão da verdade
exclusiva e perceber que juntos somos mais fortes", analisa.
Currículo
não é mais tão decisivo
Um caminho para transformar a nossa realidade atual é
investindo em novos modelos educacionais. A percepção de Englert é a de que
hoje estamos formando dezenas de milhares de pessoas para um perfil de trabalho
que não existe mais. E o reflexo desta desconexão são as milhares de vagas
abertas que não são preenchidas porque falta pessoas com as habilidades
necessárias.
"É preciso entender quais são as tecnologias que
impactam o seu mercado, quais são os novos modelos de negócios que surgem e
qual é a nova forma de aprender, todos os dias, toda a semana um pouquinho.
A pergunta do futuro ou do presente é: não é onde você estudou é como você
se desenvolve, aponta o CEO da StartSe.
"Isso está acontecendo porque o mercado impera. As companhias
não estão mais exigindo currículo porque entendem que ele não vai mais dizer se
o a pessoa atende o que elas estão buscando. As empresas de educação vão ter de
entender que a dinâmica de aprendizado mudou e que elas precisam se conectar ao
máximo possível com a realidade", diz.
Fonte:
Jornal do Comércio RS