Institucional Consultoria Eletrônica

Nota Técnica Contábil de Clarificação 012/2021- Receitas, Custos e Despesas Diferidas à Luz do Regime de Competência


Publicada em 02/02/2021 às 09:00h 


Ementa:  Receitas, custos e despesas diferidas, à luz do regime de competência, contido no art. 177 da Lei 6.404/1976.

 

Introdução:

A presente Nota Técnica[1] tem por objetivo clarificar e prestar uma orientação científica, em relação à seguinte questão fática técnica-contábil:

Qual o tratamento a ser dispensado, em relação ao registro nas demonstrações contábeis-financeiras, das receitas, custos e despesas diferidas, à luz do regime de competência, contido no art. 177 da Lei 6.404/1976?

 

1.   Contextualização e os consulentes:

Os consulentes, aqui representados pelos ilustres leitores de nossa literatura, que compõem o mercado dos operadores da contabilidade e do direito, sejam contadores, auditores, advogados, juízes, árbitros, professores e/ou peritos forense-arbitral, os quais necessitam da luz do princípio da veracidade, para fins do afastamento de interpretações ambíguas ou polissêmicas, um testemunho técnico, vinculado à realidade dos registros contábeis das receitas, custos e despesas diferidas, à luz do regime de competência, contido no art. 177 da Lei 6.404/1976.

As dúvidas existentes têm como ponto controvertido, a busca de diretrizes, no que diz respeito às hipóteses de receitas, custos e despesas diferidas, razão pela qual tornou-se oportuna a elaboração da presente Nota Técnica de Clarificação, para esclarecer e propiciar meios adequados ao convencimento técnico dos utentes, na prevenção e combate de interpretações equivocadas e nocivas, a constância da verdade real que se espera dos relatórios contábeis.


 

2.   Principais elementos fáticos considerados:

1.   Método do raciocínio lógico-contábil, oriundo da teoria pura da contabilidade e sua teoria auxiliar, a da essência sobre a forma;

2.   Interpretação da lei de forma epistemológica[2] pari passu com a fatores consuetudinários da ciência da contabilidade[3];

3.   177 da Lei 6404/1976 e art. 1.188 do CC/2002;

4.   Princípio contábil da epiqueia contabilística, que sustenta a teoria pura da contabilidade, este princípio determina uma forma de interpretação razoável ou moderada de uma lei, ou de um direito postulado em juízo ou de um preceito da política contábil. Logo, temos a equanimidade ou disposição de reconhecer o direito de todas as pessoas envolvidas em uma relação, com imparcialidade e independência de juízo científico;

5.   Princípio da fidelidade e clareza, que implica em demonstrar a situação real;

6.   A doutrina como fonte de solução de lacunas e de referência bibliográficas, com seus conceitos, em sintonia à Normatização Brasileira da Perícia Contábil, NBC TP 01 R1, §41[4], editada em 2020 pelo Conselho Federal de Contabilidade.


3.   Esclarecimento técnico e as suas fundamentações

Em relação à consulta, ou seja, sobre os questionamentos passamos a expor:



QUESITO


Qual o tratamento a ser dispensado, em relação ao registro nas demonstrações contábeis-financeiras, das receitas, custos e despesas diferidas, à luz do regime de competência, contido no art. 177 da Lei 6.404/1976?


 

RESPOSTA


À luz do Código Civil, art. 1.188, o balanço patrimonial deverá exprimir, com fidelidade e clareza a situação patrimonial real. E o art. 177 da Lei 6404/1976, prevê a adoção na escrituração, a obediência aos preceitos da legislação e aos princípios de contabilidade, além da obrigatoriedade do regime de regime de competência[5].


Considerando uma ponderação de juízo científico-técnico, na nossa interpretação, concluímos pela existência de quatro condicionantes, para a sua correta aplicação, conforme segue:



1º) Condicionante: "o balanço, seja ele patrimonial ou de resultado econômico, deverá refletir com fidelidade a real situação patrimonial".


Tem que existir fidelidade capaz de demonstrar a real situação patrimonial, essa é a premissa do condicionante.



2º) Condicionante"a adoção dos princípios de contabilidade".


Neste condicionante, avulta a importância da existência de literatura que esclareça as regras dos princípios contábeis. É deveras relevante saber o conceito dos princípios dos teoremas e das teorias.



3º) Condicionante: "regime de competência".


Assim, está estipulado na Lei Societária, art. 177 da Lei 6404/1976. Vinculado a este condicionante temos a notória doutrina contábil, pois a lei não conceituou o que é o regime de competência e a sua distinção com o regime de caixa.

Logo, considerado o ceticismo para se obter uma asseguração técnica razoável, o reconhecimento no rédito[6] do exercício de receitas, despesas e custos, não estão vinculados ao seu recebimento ou seja, ao regime de caixa, e sim, ao período em que os serviços ou produtos foram disponibilizados por uma realização econômica e não financeira, pois estes resultados não podem ser falaciosos, em decorrência de vícios, seriam nulos.



4º) Condicionante: "fidelidade dos registros".


A regra do quarto condicionante análoga ao primeiro condicionante, fidelidade, afasta os balanços maquiados e a possibilidade de distribuição de lucros fictícios. Neste condicionante é demonstrado o fator impeditivo e restritivo do reconhecimento antecipado e receitas na apuração do resultado.

   

Portanto, existe uma paridade e simetria científica-técnica perfeita entre a realização econômica de um fato e o seu reconhecimento no balanço de resultado econômico.


 

5º) Condicionante: "receita antecipada não representa renda e sim uma obrigação".


A regra do quinto condicionante, afasta as interpretações polissêmicas e ambíguas, pois a possibilidade de reconhecimento de pseuda receitas, que majora o patrimônio líquido, é algo abominável pelo viés técnico-científico.



6º) Condicionante: "a receita diferida não se confunde com o adiantamento de fregueses ou de clientes".


A regra deste condicionante é que na conta de passivo circulante, referente ao adiantamento de fregueses/clientes, é registrado o adiantamento por conta de "pedidos de produtos ou serviços". O registro do adiantamento recebido de fregueses ou clientes, por conta de um encaixe que não caracteriza receita. E a receita diferida, não esta necessariamente  vinculada ao encaixe.


E sem embargos às questões tributárias vinculadas aos fatos geradores da base de cálculo de tributos e contribuições sociais, e/ou de gestões temerárias sejam ilícitas ou dolosas que antecipam resultados econômicos, não abordadas na Nota Técnica, pois tratamos aqui apenas das questões de matéria contábil de fato[7].  Apresentamos a solução para o diferimento.

   

O diferimento de uma receita, custo e despesas, ocorre dentro de um exercício social quando os fatos afetam vários períodos contábeis. As parcelas devem ser divididas, ou seja, devem ser diferidas, para os respectivos exercícios sociais, dentro dos quais as receitas, os custos e as despesas são abatidos pela sua transferência para as contas de resultado. Em paridade e simetria ao regime da competência. Ainda que não exista previsão explícita na Lei 6404/1976, a regra consuetudinária e lógica contabilística "epiqueia[8]" é: as receitas diferidas, os custos e as despesas devem ser reconhecidos simultaneamente e exclusivamente no resultado do exercício social em que ocorreu a sua realização econômica.

   

Descrevemos com parte da solução a esta consulta, os seguintes conceitos:



RECEITAS DIFERIDAS - O diferimento de uma receita ocorre dentro de um exercício social quando a sua realização econômica afeta vários períodos contábeis. As parcelas devem ser divididas, ou seja, devem ser diferidas, para os respectivos exercícios sociais, dentro dos quais, receitas são reconhecidas pela sua transferência as contas de resultado. Em paridade e simetria ao princípio ou seja, ao regime da competência.  As receitas diferidas devem ser registradas no passivo exigível a longo prazo, ou seja, passivo não circulante, e representa receitas futuras que uma pessoa jurídica recebe por produtos e/ou serviços que ainda não forneceu ou produziu. Essa alocação no passivo não circulante é necessária em função da existência de uma obrigação, entregar produtos ou prestar serviços, pois é possível que no  preço da venda de um produto ou serviço, esteja  incluído a quantia identificável e relacionada a entrega de produtos e/ou a prestação de serviços subsequentes à data do contrato, devendo  essa parcela da receita ser diferida e reconhecida como receita durante o exercício social em que o produto ou serviço vier a ser disponibilizado ao freguês/cliente.


CUSTO DIFERIDO -  O diferimento de um custo se faz necessário quando afeta vários períodos contábeis. As parcelas devem ser apropriadas, ou seja, deve ser diferida para os respectivos exercícios sociais, dentro dos quais os custos são reconhecidos pela sua transferência para as contas de resultado. Em paridade e simetria ao regime da competência.


DESPESAS DIFERIDAS - são gastos temporariamente ativados, por não se apropriam em um só exercício social, podendo ser apropriadas em diversos exercícios sociais em razão de sua competência. Os gastos relativos ou atribuíveis aos exercícios seguintes. Logo, gastos que se apuraram em um período ou exercício, mas que se refere o exercício seguinte. Devem ser apropriadas em diversos exercícios sociais em razão de uma necessária paridade e simetria ao regime de competência.


DIFERIR - Diferir significa postergar a ocorrência de um fato contábil.


4.   Diagnóstico relativo ao epicentro da questão técnica:

   

Existe uma simetria científico-técnica perfeita entre a ciência contábil, os seus conceitos, princípios e os relatórios contabilísticos.

   

O estudo patológico contabilístico, aqui representados pelos condicionantes, alerta para riscos de maquiagem dos balanços, que se tornam ainda mais putativamente danosos, com o reconhecimento de receitas antecipadamente sem os respectivos custos e despesas, o que se considera uma falácia, quiçá, um paralogismo defendido por sofistas que criam sofismas.

   

É deveras importante o fato de que os conceitos são guias da ciência, pois são eles que ensejam evidências doutrinárias e afastam interpretações ambíguas ou polissêmicas, removendo com isto muitas das controvérsias, criando as condições propícias à construção de uma boa jurisprudência.

   

E por derradeiro, considerando o exposto, ou seja, juízo de ponderações científicas, com base na legislação, na doutrina analisada, nas análises técnico-científicas demonstradas nos itens anteriores, no  regime de competência,  no  princípio contábil da epiqueia contabilística, que sustenta a teoria pura da contabilidade, o qual determina uma forma de interpretação razoável ou moderada de uma lei, nos permite concluir pelo reconhecimento de receitas, custos e despesas, no balanço de resultado econômico, somente e exclusivamente no exercício social em que ocorre a realização econômica, ou seja, no momento em que os produtos ou os serviços são transferidos para o freguês/cliente. Assim sendo, o reconhecimento exclusivamente da receita, assim que a venda tenha sido realizada, contrato assinado com base confiável, e/ou a adoção do cronograma de pagamento constante do contrato de compra e venda, como critério de reconhecimento de receita, é um erro de cognição que afronta o regime de competência.

 

5.   Encerramento:

   

Este documento, representa uma Nota Técnica Contábil de Clarificação, emitida pelo laboratório de perícia forense-arbitral, Zappa Hoog e Petrenco, sobre fato contábil, "regime de competência vinculado à escrituração de receitas, custos e despesas" que lhe foi questionada. Com o objetivo de demonstrar as questões de patologia contábil, uma vez que esta afasta as ficções e esclarece os equívocos de acepção e reconduz os fatos a uma correta interpretação contábil científica.

 

[1] Uma Nota Técnica Contábil de Clarificação é um documento elaborado por um profissional contador, especializado em determinado assunto. E é emitida quando identificada a necessidade de uma clarificação técnica, ou seja, uma fundamentação formal e específica para oferecer uma solução para uma tomada de decisão em um caso em concreto.

[2]  INTERPRETAÇÃO EPISTEMOLÓGICA - representa um estudo crítico dos princípios, dos teoremas, das hipóteses e dos resultados dos diversos fenômenos e suas patologias. E surge no curso de uma  investigação científica ou na reflexão da busca de soluções de problemas, métodos e teorias. (HOOG, Wilson A. Zappa. Moderno Dicionário Contábil. 12. ed,. Curitiba: Juruá Editora, 2021, no prelo.)

[3]   Os fatores consuetudinários da Ciência Contábil são os aspectos relativos aos usos e costumes científicos, comuns à maioria dos lidadores da ciência social contábil, situação onde a essência dos atos e fatos se sobrepõe à forma. São as regras, princípios, convenções e normas de conhecimento notório pela maior parte da população de contadores contemporâneos. Pelo viés da logística contábil, estas regras ou fatores cognitivos, em sua grande maioria são utilizados como uma forma de concordância de ideias, de opiniões entre os provedores e repetidores da ciência. Usos e costumes levarão em consideração os objetivos, os fins da norma; tem-se que observar a finalidade da norma descobrindo-se a racionalidade da própria norma; qual o seu conteúdo, qual a sua missão.

[4]  NBC TP 01 R1, §41: "Tratando-se de termos técnicos atinentes à Ciência Contábil, devem ser acrescidos dos seus respectivos conceitos doutrinários, sentido e alcance contabilístico de cada um dos termos técnicos, além de esclarecimentos adicionais ou em notas de rodapé. É recomendada a utilização daqueles termos já consagrados pela literatura contábil."

[5] REGIME DE COMPETÊNCIA - método contábil de registrar tudo o que se relaciona ou compete ao exercício em curso, independentemente dos desembolsos ou recebimentos. É o método usualmente utilizado na escrituração contábil no Brasil, por força da política contábil nacional.

[6]  A teoria do rédito representa o resultado da eficiência da empresa, ou seja, objeto social, pelo seu estabelecimento, que pode ser o lucro ou o prejuízo, confronto das rendas, custos e despesas (Teoria esta estudada e citada por SÁ: História Geral e das Doutrinas da Contabilidade. São Paulo: Atlas, 1997, p. 112). O criador desta teoria é Gino Zappa, em Milão na Itália, no ano de 1927, no livro: II Reddito di Impresa - "O Rédito da Empresa".

[7] MATÉRIA DE FATO (fática científica) - representa um tema vinculado à técnica e ciência, que são aquelas em que os doutrinadores epistemólogos se debruçam em suas pesquisas e interpretações dos fenômenos patrimoniais.

[8] Epiqueia representa uma interpretação moderada e equilibrada da intenção do legislador efetuado por um doutrinador, a qual consiste na suposição da aplicação de um silêncio eloquente em caso determinado, embora este se ache explícito e compreendido no texto da lei.

 

 


Tijucas do Sul, 19 de janeiro de 2021.



 

 

Por Prof. Mestre Wilson Alberto Zappa Hoog - Perito Contador - CRC/PR 21594/0-1



Gostou da matéria e quer continuar aumentando os seus conhecimentos com os nossos conteúdos?

Assine, gratuitamente, a nossa Newsletter Semanal M&M Flash, clicando no link a seguir:

https://www.mmcontabilidade.com.br/FormBoletim.aspx, e assim você acompanha as nossas atualizações em primeira mão!








Sobre o(a) colunista:



Mestre em ciência jurídica, bacharel em ciências contábeis, arbitralista, mestre em direito, perito-  contador, auditor, consultor empresarial, palestrante, especialista em avaliação de sociedades empresárias, escritor e pesquisador de matéria contábil, professor doutrinador de perícia contábil, direito contábil e de empresas em cursos de pós-graduação de várias instituições de ensino. Informações sobre o autor e suas obras podem ser obtidas em: http://www.jurua.com.br/shop_search.asp?Onde=GERAL&Texto=zappa+hoog.

Currículo Lattes em: http://lattes.cnpq.br/8419053335214376 .

E-mail: wilson@zappahoog.com.br.



Telefone (51) 3349-5050
Vai para o topo da página Telefone: (51) 3349-5050