Tendo como referente
o fato de que o Juiz será assistido por perito quando a prova do fato depender
de conhecimento técnico ou científico, inclusive os vinculados à ciência social
da contabilidade; à luz do art. 156 do CPC/2015, apresentamos uma resumida análise
sobre as inspeções e validações ou rejeições dos elementos constantes dos
autos, para a solução de uma liquidação de sentença por arbitramento.
A
priori os litigantes devem apresentar nos autos do processo, seja no de
conhecimento[1] ou no da
liquidação, os documentos elucidativos e necessários para que uma sentença
ilíquida seja convertida em líquida.
Existindo uma liquidação de sentença que
envolva matérias contábeis, tais como: lucros cessantes, apuração de haveres ou
deveres e indenizações, entre outros fatos patrimonais. O perito com
lastro no ceticismo, deve se ater às questões da validação dos
documentos, relatórios e informações, como, por exemplo: a existência do
conjunto das demonstrações financeiras, os documentos de suporte, e se a
escrituração atende os aspectos da individuação e caracterização e cronologia,
em simetria ao art. 1.179 e seguintes do CC/2002, para se obter o nível de
asseguração, que dividem-se em três níveis: a razoável, a limitada e a
inexistente, pois as irregularidades e anomalias, patologias, inclusive a
ausência da escrituração, criam no âmbito da aplicação do direito contábil, via
perícia, uma asseguração limitada ou inexistente, cujo epicentro é uma dúvida
razoável, e diante de uma dúvida razoável, o perito tem o dever ético de
afastar as miragens de lucros cessantes[2] e de haveres entre outros valores a serem pagos.
Sem prejuízo do robusto e notário fato que é a conditio sine qua non[3], de que o onus
probandi[4] com
efeito erga omnes[5], é
de quem alega a existência de lucros cessantes e tem que apresentar prova
substancial, e a ausência de prova contábil dos lucros cessantes, é um fator
modificativo ou restritivo do direito de quem pede a indenização.
Por uma questão de
justiça, existe a ampla e não restritiva, defesa e contraditórios técnico-científicos,
em cujo amplo horizonte, reside os registros contábeis, que são
indivisíveis, e provam a favor ou contra o seu titular, este é o espírito geral
dos arts. 417 ao 419 do CPC/2015 e do art. 226 do CC/2002.
O perito precisa ter certeza sobre o status da sua
dúvida em relação as provas contábeis. O filósofo Aquino[6] assim lecionou: "Tenha certeza de suas dúvidas".
A certeza de que existe evidência contábil é necessária para se evitar a
maldição do Mito da Caverna de Platão[7], sobre a ilusão da forma, verdade formal,
sobre a essência, verdade real.
E a partir da constatação de uma
asseguração inexistente em relação aos fatos, como, por exemplo, ausência ou
fidelidade do balanço de resultado econômico para a precificada dos lucros
cessantes, pela via da métrica contábil adequada, que é a margem de
contribuição, deve o perito, por uma questão de epiqueia contabilística,
no uso do procedimento de testabilidade, rejeitar, para evitar miragens de
lucros, e não utilizar documentos que não possuam uma certeza, evidência
científica do fato. Apresentando uma solução, que é o arbitramento de lucro com
lastro na legislação tributária, presunção legal, e concomitantemente a
doutrina,[8] e a norma
federal de perícia contábil, pois o arbitramento, à luz da NBC TP 1 (R1) de
2020, "é a determinação de valores,
quantidades ou a solução de controvérsia por critério técnico-científico".
Como epicentro da
questão, evidência científica, surge o §1° e o §2º do art. do art. 927 do
CPC/2015, onde aparece a hipótese da participação de órgãos, como um
Laboratório de Perícia forense-arbitral, e implicitamente o uso de doutrina que
evidência uma solução para questões científicas.
A
moderna doutrina que trata dos lucros cessantes vai além da fala dos
epistemólogos, pois representa uma solução para se interpretar um caso real,
como uma fonte de direito que indica uma solução para uma interpretação,
arbitramento, ou para suprir lacunas e silêncios eloquentes. O seu comando serve
de base para se consagrar teorias e conceitos, além de contribuir para o
desenvolvimento da ciência, conferindo uma tendência uniformizadora, afastando
conceitos vagos polissêmicos e ambíguos evitando-se dogmas, anomias,
epistemicídio, negativismo e falácias, que criam as ilusões de lucros cessantes
que leva a uma locupletação sem causa. Até porque, as indenizações como lucros
cessantes, servem para se reestabelecer o status quo[9], e não para gerar enriquecimento indevido
lastreado no animus
lucrandi.
A ausência de
doutrinas e órgãos como os laboratórios de perícia contábeis, criam uma
desarmonia entre os peritos, advogados, ministério público, julgadores e a
coletividade como um todo, fazendo com que se criem expectativas de injustiças
na estrutura social de um povo.
E por derradeiro os protagonistas deste
enredo da questão científica, são os peritos especialistas no tema, o nomeado
pelo julgador e os indicados pelos litigantes, e em especial, também a
possibilidade da participação do amicus
curiae,[10] cuja atuação
está amparada no art. 138 do CPC/2015. Pois, com certeza, pelo menos é o que se
espera, as miragens de lucros cessantes serão afastadas pelo perito, em
decorrência do dever de colaborar para descoberta da verdade, art. 6º do
CPC/2015, e os princípios constitucionais da impessoalidade e moralidade, que
regem a função do perito judicial como sendo a manus longa.
REFERÊNCIAS:
BRASIL. Lei 13.105, de 16 de março de 2015.
Código de Processo Civil.
_____. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002.
Institui o Código Civil.
_____. Conselho Federal de Contabilidade. NBC TP
01 (R1), de 19 de março de 2020. Dá nova redação à NBC TP 01, que dispõe sobre
perícia contábil.
HOOG, Wilson A. Z. Moderno Dicionário Contábil - da Retaguarda à
Vanguarda - Contém os Conceitos das IFRS. Revista, Atualizada e Ampliada. 11.
ed. Curitiba: Juruá, 2020. 691 p.
_____. Perdas,
Danos e Lucros Cessantes em Perícias Judiciais. 7.ed. Curitiba:
Juruá,2021. 280 p.
[1] O processo
de conhecimento é a fase de cognição onde são apresentadas toda a produção
de provas, dando conhecimento dos fatos ao julgador, a fim de que
este possa dizer o direito e a obrigação dos litigantes na pronúncia da
sentença.
[2] Lucro cessante à luz da Teoria Pura da Contabilidade -
à luz da Teoria Pura da Contabilidade, em especial, a epiqueia contabilística,
o lucro cessante corresponde rigorosamente ao montante da margem de
contribuição líquida do IR e CS e tributos e não ao lucro líquido. A
compreensão deste fenômeno se torna deveras importante, para que sejam
propiciados os meios científicos contábeis à obtenção de uma justiça justa.
(HOOG.
Wilson A. Z. Perdas, Danos e Lucros Cessantes
em Perícias Judiciais. 7. ed. rev. e atual. de acordo com
o Novo Código de Processo Civil. Curitiba: Juruá, 2021)
[3] Conditio
sine qua non - significa: condição sem a qual não. Expressão
que indica circunstâncias absolutamente indispensáveis à validade ou existência
de uma coisa ou da aplicação de uma norma. (HOOG, Wilson A. Z. Moderno Dicionário Contábil - da Retaguarda à
Vanguarda - Contém os Conceitos das IFRS. Revista, Atualizada e Ampliada. 11.
ed. Curitiba: Juruá, 2020.)
[4] Onus
probandi - tem o sentido de: uma obrigação de provar; ou seja,
ônus da prova. (HOOG. Wilson A. Z. Perdas, Danos e Lucros Cessantes
em Perícias Judiciais. 7. ed. rev. e atual. de acordo com
o Novo Código de Processo Civil. Curitiba: Juruá, 2021.)
[5] Erga omnes -
quer dizer que tem força de norma jurídica contábil para todos, ou todos se
sujeitam a esta proteção legal. No âmbito da contabilidade no seu ramo de
perícia contábil, pode ser usado, quando se quer dizer que algo, tem força
implícita de preceito contábil para todos, ou todos se sujeitam a esta
situação. Como exemplo de efeito erga
ommes para os contadores, temos os princípios de
contabilidade. (HOOG,
Wilson A. Z. Moderno Dicionário Contábil -
da Retaguarda à Vanguarda - Contém os Conceitos das IFRS. Revista, Atualizada e
Ampliada. 11. ed. Curitiba: Juruá, 2020.)
[6] São Tomás de
Aquino foi um frade que nasceu em 1.225 na Itália, cujas obras tiveram enorme
influência no pensamento filosófico, particularmente na ética, metafísica e
teoria política.
[7] Platão viveu na Grécia em Atenas (427 a.C a 347
a.C), foi um filósofo que teve como mentor, Sócrates e como pupilo,
Aristóteles. Entre os seus legados filósofos, destaca-se o Mito da Caverna que
é base para aos seus ensinos da teoria das formas.
[8] HOOG, Wilson A.
Z. Perdas, Danos e Lucros Cessantes em Perícias
Judiciais. 7. ed. rev. e atual. de acordo com o Novo
Código de Processo Civil. Curitiba: Juruá, 2021.
[9] Status quo - é um termo latino. O status quo está
relacionado ao estado dos fatos, das situações e das coisas. Portanto, voltar
ao status quo,
significa voltar a uma situação anterior. (HOOG, Wilson A. Z. Moderno Dicionário Contábil - da Retaguarda à
Vanguarda - Contém os Conceitos das IFRS. Revista, Atualizada e Ampliada. 11.
ed. Curitiba: Juruá, 2020.)
[10] Amicus
curiae - é uma forma de "amigo do tribunal", sendo uma pessoa
estranha à causa e com total imparcialidade e independência de juízo
científico, que auxilia o tribunal, oferecendo esclarecimentos sobre questões
técnico-científicas que são essenciais ao deslinde do processo. Esta pessoa
normalmente demonstra em sua literatura especializada, interesse científico na
causa, em virtude da relevância da matéria e de sua representatividade
doutrinária quanto à questão discutida, o julgador tem que avaliar se esta
pessoa tem representatividade e capacidade adequada para uma pronunciação
científica de forma eficiente e condizente aos interesses da justiça, a verdade
real. A participação deste amicus
curiae é de interesse científico na proteção das relações
comerciais em seu sentido amplo, uma vez que sustenta teses doutrinárias
fáticas em combate a interesses difusos públicos ou privados, que poderão ser
reflexamente atingidos com a formação de uma jurisprudência. Espera-se que o
magistrado ouça o amigo do tribunal sobre provas pré-constituídas, permita que
participe e se manifeste em audiências. (HOOG, Wilson A. Z. Moderno Dicionário Contábil - da Retaguarda à
Vanguarda - Contém os Conceitos das IFRS. Revista, Atualizada e Ampliada. 11.
ed. Curitiba: Juruá, 2020.)
Autor: Wilson A. Zappa Hoog é sócio do Laboratório de Perícia Forense
Arbitral Zappa Hoog & Petrenco, perito em contabilidade e mestre em
direito, pesquisador, doutrinador, epistemólogo, com 48 livros publicados,
sendo que alguns dos livros já atingiram a marca de 11 e de 17 edições.