Institucional Consultoria Eletrônica

Dedutibilidade das despesas com brindes e amostras grátis


Publicada em 13/10/2022 às 09:00h 


Em 1899, o escritor Rudyard Kipling, que seria laureado com o prêmio Nobel de Literatura em 1907, publicou a obra "American Notes", na qual ele descreve que os bares do Velho Oeste tinham por prática oferecer "almoço grátis" aos seus clientes que compravam uma bebida. Ocorre que era comum que as refeições fossem extremamente salgadas, de forma que eles acabavam comprando mais bebidas e, com isso, o retorno obtido com a venda das bebidas já era superior ao montante dos custos decorrentes do "almoço grátis".


A expressão "não há almoço grátis" foi popularizada pelo economista Milton Friedman, laureado com o prêmio Nobel de Economia de 1976, que, em 1975, publicou a obra "There ain't no such thing as a free lunch"[1], na qual apresenta a sua premissa de que qualquer subsídio, gasto ou ineficiência politicamente imposta será paga por alguém.


Tal alegoria é bastante interessante na medida em que pode ser trazida para o âmbito das decisões empresariais. Assim, são muitos os gastos que são suportados por uma empresa para que ela possa exercer as suas atividades empresariais e obter receitas.


O fato de que um determinado gasto é registrado contabilmente como uma despesa, diminuindo o resultado contábil, não implica a sua dedutibilidade para fins de apuração do imposto de renda. Assim, há a regra geral de dedutibilidade prevista no artigo 47 da Lei n. 4.506/64 pela qual são operacionais as despesas não computadas nos custos, necessárias à atividade da empresa e à manutenção da fonte produtora.


Além da referida regra geral de dedução das despesas, há uma série de regras específicas, tais como as regras de dedutibilidade dos brindes e das amostras.


Neste artigo, o foco se dará única e exclusivamente sobre a dedutibilidade das despesas com amostras grátis, ainda que a alegoria do "almoço grátis" possa se enquadrar em maior ou menor grau tanto com as amostras quanto com os brindes.


O artigo 54 da Lei n. 4.506/64[2] trata especificamente da dedutibilidade das despesas de propaganda na base de cálculo do imposto de renda, quando elas estão diretamente relacionadas com a atividade explorada pela empresa.


Dentre as hipóteses de propaganda contidas no referido dispositivo legal, constam de forma expressa as despesas relativas às amostras, mais precisamente no artigo 54, V, da Lei n. 4.506/64.


Vale notar que as amostras em referência podem se referir àquelas distribuídas gratuitamente por laboratórios químicos ou farmacêuticos, mas também àquelas distribuídas por outras empresas que utilizem esse sistema de promoção de venda de seus produtos.


O referido dispositivo legal determina ainda que para que ocorra a dedutibilidade das amostras, torna-se indispensável que:


(i)  a distribuição das amostras seja contabilizada nos livros de escrituração da empresa, pelo preço de custo real;


(ii) a saída das amostras esteja documentada com a emissão das correspondentes notas fiscais; e


(iii)o valor das amostras distribuídas em cada ano não ultrapasse os limites estabelecidos pela Divisão do Imposto de Renda (atualmente Receita Federal do Brasil), até o máximo de 5% da receita bruta obtida na venda dos produtos, tendo em vista a natureza do negócio.


Cumpre ressaltar ainda que a Receita Federal poderá admitir que as despesas de amostras ultrapassem, excepcionalmente, o limite de 5% da receita bruta obtida na venda dos produtos, nos casos de planos especiais de divulgação destinados a produzir efeito além de um exercício, devendo a importância excedente daqueles limites ser amortizada no prazo mínimo de três anos, a partir do ano seguinte da realização das despesas.


No âmbito infralegal, há atos normativos que irão regular o tema de forma mais detalhada.


A título de ilustração, o Parecer Normativo CST nº 15/76 traz uma distinção entre brindes e amostras, estabelecendo que os brindes se destinam a promover a organização (ou empresa) e não necessariamente seus produtos, ao passo que as amostras são objetos distribuídos gratuitamente, com a finalidade de promoção, e que são de diminuto ou nenhum valor comercial.


De maneira ainda mais específica, o Parecer Normativo CST nº 17/76 previu que o percentual de 5%, limitativo da despesa de propaganda com amostras, se aplica à receita bruta global dos produtos elaborados, de forma que o cálculo do limite não deverá ser feito de forma individualizada para cada produto.


Feitas as considerações gerais sobre o tema, analisaremos os precedentes do Carf que tratam do assunto.


No Acórdão 1401-000.769 (de 10/4/12), foi dado provimento ao recurso voluntário, de forma unânime, de modo que foi reconhecida a dedutibilidade das despesas com amostras grátis para fins de apuração do imposto de renda.


Nesse sentido, constou no voto do conselheiro relator que a despesa com amostra grátis não se confunde com a despesa com brindes, sendo que ainda que tivesse ocorrido uma imprecisão terminológica e a despesa com amostras ter sido erroneamente denominada como despesa com brindes, isto não lhe retiraria a dedutibilidade uma vez que a amostra tem por objetivo a divulgação dos produtos, mormente quando os produtos oferecidos fazem parte da linha de produção da empresa, havendo citação expressão do Acórdão nº 101-95.823 (de 19/10/06) do antigo Conselho de Contribuintes.


No Acórdão nº 1401-001.499 (de 20/01/16), foi negado provimento, de forma unânime, ao recurso de ofício, de forma que foi mantido o entendimento já manifestado na DRJ de que seriam dedutíveis as despesas com amostras grátis.


Constou inclusive no voto do conselheiro relator que: "resta claro ser dedutível, como despesa de propaganda, o valor das amostras distribuídas, até o máximo de 5% da receita líquida que, segundo entendimento fixado pela Receita Federal, mediante o Parecer Normativo CST n° 17, de 27 de fevereiro de 1976, é aquela obtida na venda de todos os produtos da mesma linha (farmacêuticos)".


No presente acórdão foi manifestado o entendimento de que o cálculo do limite de 5% da receita bruta não deve ser feito de acordo com a receita de cada produto, mas sim do total da receita bruta da venda de todos os produtos da mesma linha.


No Acórdão nº 1201-002.332 (de 14/8/18), foi dado provimento ao recurso voluntário, por unanimidade, de forma que foi reconhecida a dedutibilidade das despesas com amostras de uma empresa do setor de blindagem.


Para tanto, foi levado em consideração que o montante das amostras grátis distribuídas pela empresa representaram apenas 0,2% de sua receita bruta, de modo que o limite previsto na lei foi devidamente atendido.


Também foi apontado no voto do conselheiro relator que haveria uma necessidade de envio de amostras aos clientes para que houvesse inclusive uma diminuição das perdas com a devolução de pedidos inteiros, por eventuais imperfeições do produto ou insatisfação das indústrias de vidro.


No Acórdão nº 1302-003.995 (de 15/10/19), constou no voto do relator que os documentos apresentados pelo contribuinte não foram considerados suficientes para comprovar as despesas com amostras, sendo que constou expressamente ainda que a maior parte dos documentos apresentados não guardavam qualquer relação com os valores glosados.


Diante de tal cenário, somente foi reconhecida a dedutibilidade de uma parcela das despesas com amostras em que se entendeu que houve comprovação da despesa, de forma que foi dado provimento parcial ao recurso voluntário, de forma unânime.


Diante do exposto, nota-se que a maior parte das decisões tem sido favoráveis aos contribuintes, desde que eles tenham devidamente comprovado que as amostras estão diretamente relacionadas com a atividade explorada pela empresa, bem como estejam preenchidos os requisitos do artigo 54, V, da Lei nº 4.506/64, isto é, tenham ocorrido os seguintes requisitos: (i) a distribuição das amostras seja contabilizada nos livros de escrituração da empresa, pelo preço de custo real; (ii) a saída das amostras esteja documentada com a emissão das correspondentes notas fiscais; e (iii) o valor das amostras distribuídas em cada ano não ultrapasse 5% da receita bruta obtida na venda dos produtos, sendo que o cálculo de tal limite não deverá ser feito individualizada por produto.


[1] FRIEDMAN, Milton. There ain't no such thing as a free lunch. LaSalle (Illinois): Open Court, 1975.


[2] Lei n. 4.506/64: "Art. 54. Sòmente serão admitidas como despesas de propaganda, desde que diretamente relacionadas com a atividade explorada pela empresa:


I - Os rendimentos de trabalho assalariado, autônomo ou profissional, e a aquisição de direitos autorais de obra artística;


II - As importâncias pagas a empresas jornalísticas, correspondentes a anúncios ou publicações;


III - As importâncias pagas a empresas de radiodifusão ou televisão, correspondentes a anúncios, horas locadas, ou programas;


IV - As despesas pagas a quaisquer empresas, inclusive de propaganda, desde que sejam registradas como contribuintes do imposto de renda e mantenham escrituração regular;


V - O valor das amostras, tributáveis ou não pelo Imposto de Consumo, distribuídas gratuitamente por laboratórios químicos ou farmacêuticos, e por outras empresas que utilizem esse sistema de promoção de venda de seus produtos, sendo indispensável:


a) que a distribuição das amostras seja contabilizada nos livros de escrituração da empresa, pelo preço de custo real;


b) que a saída das amostras esteja documentada com a emissão das correspondentes notas fiscais;


c) que o valor das amostras distribuídas em cada ano não ultrapasse os limites estabelecidos pela Divisão do Imposto de Renda, até o máximo de 5% (cinco por cento) da receita bruta obtida na venda dos produtos, tendo em vista a natureza do negócio.


Parágrafo único. Poderá ser admitido, a critério da Divisão do Imposto de Renda, que as despesas de que trata o item V ultrapassem, excepcionalmente, os limites previstos na letra c, nos casos de planos especiais de divulgação destinados a produzir efeito além de um exercício, devendo a importância excedente daqueles limites ser amortizada no prazo mínimo de 3 (três) anos, a partir do ano seguinte da realização das despesas".


Autor:


Alexandre Evaristo Pinto é conselheiro titular da Câmara Superior de Recursos Fiscais da 1ª Seção do Carf, ex-conselheiro titular da 2ª Seção do Carf, doutorando em Controladoria e Contabilidade pela Universidade de São Paulo (USP), doutor em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela USP, mestre em Direito Comercial pela USP, professor do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT) e presidente da Associação dos Conselheiros Representantes dos Contribuintes no Carf (Aconcarf).









Fonte: Revista Consultor Jurídico






Gostou da matéria e quer continuar aumentando os seus conhecimentos com os nossos conteúdos?

Assine, gratuitamente, a nossa Newsletter Semanal M&M Flash, clicando no link a seguir:

https://www.mmcontabilidade.com.br/FormBoletim.aspx, e assim você acompanha as nossas atualizações em primeira mão!




Telefone (51) 3349-5050
Vai para o topo da página Telefone: (51) 3349-5050