A
torpeza comum e a bilateral, embora sejam temas vinculados ao princípio da
boa-fé, portanto, mais próximo da ciência jurídica do que da ciência da
contabilidade, é deveras importante para os peritos, pelas consequências que
geram, portanto, vamos abordar como uma pequena reflexão em relação à
importância do seu conceito, como uma cópia in verbis do nosso livro: Moderno Dicionário Contábil - da Retaguarda à Vanguarda. 12. ed. Curitiba: Juruá, no
prelo,2023, como segue.
TORPEZA - um ato torpe, pelo viés
da ciência da contabilidade e jurídica, é um negócio viciado por fraude,
desonesto e que se afasta da razoabilidade e da boa-fé. A boa-fé no mundo dos
negócios é algo comutativo, pois trata-se de uma obrigação recíproca a que se
obrigam todos de forma equivalente. E a torpeza não pode ser alegada
ou aproveitada por quem tenha dado causa a ela. E em situações que envolvam
processos judiciais, quem deu causa a torpeza poderá ser condenado à litigância
de má-fé. Portanto, um ato torpe é aquele praticado em sentido contrário à lei,
à ética e à função social da propriedade. Ao agir com torpeza, a pessoa
tem, ou deveria ter, conhecimento do mal que pode causar a outrem. Agindo, assim,
com desonestidade, ferindo os princípios da boa-fé, da probidade, que regem os
negócios jurídicos. Não se admitindo em um Estado Democrático de Direito, a
penalização de uma pessoa sem se comprovar a conduta torpe, o nexo de
causalidade, e o resultado pretendido. É fato incontrovertido que a ordem
jurídica não chancela exercício jurídico inadmissível (art. 187 do CC/2002), o
que significa a obrigação da adoção de comportamento ético das partes de uma
relação contratual, negócio jurídico, pontualmente no exercício de direitos, o
parâmetro do princípio da boa-fé, o que veda o abuso de direito ou de poder,
pois em todos os negócios jurídicos busca-se uma conduta baseada na confiança,
na função social, na dignidade, na lealdade e com a intenção à boa-fé,
confiança e informação correta, sem a abominável onerosidade excessiva para uma
das partes em detrimento da outra. Aplicando-se nas relações jurídicas o
princípio do venire
contra factum proprium, princípio que veda o comportamento
contraditório e imprevisto que pode causar surpresa na outra parte, portanto,
temos o axioma de que "ninguém pode comportar-se contra seus próprios atos".
Por exemplo, um aumento ou diminuição da receita, pela via da violação da
norma que disciplina a demonstração do resultado de um exercício, não pode ser
usada posteriormente por quem busca se beneficiar da própria torpeza, neste
exemplo, envolvendo a Demonstração do Resultado do Exercício
(DRE) para a precificação de lucros cessantes, temos a situação de abuso
verificado quando uma pessoa viola uma norma jurídica, e, posteriormente, tenta
tirar proveito desta violação em uma demanda judicial ou arbitral, porquanto, o
dever de probidade deve ser observado em todas as fases, seja anterior ou posterior
a do processo judicial ou arbitral. Outro exemplo, é a situação de passivo
fictício ou de caixa dois em balanços para a apuração de haveres, pois a
sociedade que vai pagar haveres, não pode se beneficiar de balanço com passivos
fictícios ou com omissão de caixa dois, pois tal fato gera enriquecimento sem
causa, ou seja, quem busca indenização por lucro cessante, não pode pedir a
inclusão de caixa dois, e quem vai pagar haveres de sócios, não pode exigir a
precificação sem o caixa dois e seu efeito em fundo de comércio.
TORPEZA
BILATERAL -
representa uma fraude recíproca, ou seja, realizada por duas pessoas, como o
contratante e o contratado, onde o autor e a vítima, ambos visam a obtenção de
vantagem indevida em detrimento do prejuízo alheio, empregando para tal um meio
operante fraudulento. Exemplo: compra e venda de mercadoria com subfaturamento,
onde o comprador e o vendedor obtêm ganho ilícito, e o estado sofre as
consequências de uma evasão fiscal. Vide artigo 150, do CC/2002 que prevê:
"Se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o
negócio, ou reclamar a indenização", o CPC/2015 cuida da matéria, em seu artigo
276.
Como demonstrado, salta aos olhos a importância da veracidade dos relatórios
contábeis, e por isso, é importante um suporte de um perito
contador especializado no tema antes da propositura da ação para fazer um
parecer e avaliar o corpo de provas existente e os riscos de torpeza.
REFERÊNCIAS
HOOG, Wilson A. Z. Moderno Dicionário Contábil - da Retaguarda à
Vanguarda. - Contém os Conceitos das IFRS. Revista, Atualizada e Ampliada. 12.
ed. Curitiba: Juruá, 2023, no prelo.
Autor:
Wilson A. Zappa Hoog é sócio do
Laboratório de Perícia-forense arbitral Zappa Hoog & Petrenco, perito em
contabilidade e mestre em direito, pesquisador, autor da Teoria Pura da
Contabilidade e suas teorias auxiliares, doutrinador, epistemólogo, com 49
livros publicados, sendo que existe livro que já atingiram a marca da 17ª
edições.