Sabe-se que as
Microempresas (ME) são aquelas empresas com receita bruta igual ou inferior a
R$ 360.000,00 em cada ano-calendário, ao passo que as Empresas de Pequeno Porte
(EPP) são aquelas que possuem receita bruta maior que as microempresas, mas
igual ou inferior a R$ 4.800.000,00 em cada ano-calendário.
A Nova Lei de
Licitações, Lei n. 14.133/21, em seu art. 4º, deixa evidente a aplicação dos
arts. 42 ao 49 da Lei Complementar n. 123/06 às licitações e aos contratos administrativos
regidos pela Nova Lei de Licitações, de modo a assegurar às Microempresas e às
Empresas de Pequeno Porte inúmeros benefícios nas contratações públicas.
Na vigência da
antiga lei de licitações (Lei 8.666/93) a lógica era simples: usufrui dos
benefícios destinados às Microempresas e às Empresas de Pequeno Porte aquelas
empresas que não extrapolaram o teto de faturamento para enquadramento no
ano-calendário da realização da licitação.
Será, empresário
licitante, que a mesma lógica se repete na Nova Lei de Licitações (Lei
14.133/21)?
A resposta,
infelizmente, é negativa - o requer atenção redobrada por parte das empresas
que contratam com o Poder Público.
Basta uma breve
análise do art. 4º, §2º da Lei 14.133/21 para se verificar que a obtenção dos
benefícios fica "limitada
às microempresas e às empresas de pequeno porte que, no ano-calendário de
realização da licitação, ainda não tenham celebrado contratos com a Administração Pública
cujos valores somados extrapolem a receita bruta máxima admitida para fins de
enquadramento como empresa de pequeno porte" (grifo nosso).
Enquanto,
antigamente, a concessão dos benefícios tinha como base o faturamento da
empresa (receita bruta), a Nova Lei de Licitações vincula os benefícios ao
valor dos contratos assinados.
Em outras palavras,
licitante: para fins da nova lei, não se leva em conta o dinheiro no bolso da
empresa, mas a mera expectativa de recebimento.
Na prática, o que se
tem, é a antecipação dos efeitos do desenquadramento às empresas que tenham
somente celebrado contratos com o Poder Público, sem, ao menos, ter faturado o
contrato assinado.
A empresa, dessa
forma, apesar de não ter extrapolado o teto voltado às Microempresas e às
Empresas de Pequeno Porte e, portanto, não ter sido desenquadrada, de fato,
para fins da Lei Complementar 123/06, está impedida de usufruir dos benefícios
destinados às Microempresas e Empresas de Pequeno
Porte nas
contratações públicas.
A Nova Lei de
Licitações, nesse sentido, encara a mera assinatura do contrato como uma presunção
de desenquadramento, capaz de ceifar os direitos daqueles que ainda não
desenquadraram.
Em razão da citada
novidade, surge o questionamento: as assinaturas de Atas de Registro de Preço
que, somadas, extrapolam o teto para enquadramento como Microempresa e Empresa
de Pequeno Porte são capazes de fazer com que os licitantes percam os
benefícios destinados às Microempresas e às Empresas de Pequeno Porte?
Nesse ponto, a
máxima prevalece: Ata não é contrato. No entanto, vale ressaltar que, apesar da
Ata de Registro de Preço, em si, não possuir status de contrato, as Notas de
Empenho e as Ordens de Serviços oriundas das Atas são equiparadas aos contratos
e, portanto, podem tolher os benefícios destinados às
Microempresas e às
Empresas de Pequeno Porte.
A presente alteração
legislativa possui extrema relevância para as empresas que contratam com o
Poder Público, uma vez que o Tribunal de Contas da União possui entendimento no
sentido de que a mera apresentação de declaração com conteúdo falso, sem
obtenção de vantagens, configura fraude à licitação, passível de aplicação das
penalidades da lei.
Nesse sentido, o
licitante desatento, que assinou contratos que extrapolam o teto para
enquadramento como ME/EPP e que apresentou, durante a licitação, declaração de
que fazia jus aos benefícios destinados às Microempresas e às Empresas de
Pequeno Porte, pode ser severamente penalizado.
Com o intuito de se
evitar eventual responsabilização, a empresa licitante, portanto, deve observar
se, no momento da licitação, possui contratos firmados com o Poder Público que,
no ano-calendário, extrapolam o limite para o enquadramento como Microempresa
ou Empresa de Pequeno Porte.
Caso, no entanto, a
empresa tenha apresentado declaração que não condiz com a sua realidade fática,
será aberto um processo administrativo sancionador, responsável por apurar os
fatos e por responsabilizar a empresa licitante. Nesse ponto, recomenda-se a
contratação de um advogado especialista para a elaboração de defesa e para o
acompanhamento do processo administrativo instaurado.
Por fim, ressalta-se
que o art. 4, §1º, I e II da Lei 14.133/21 impede que uma licitação que possua
o valor estimado superior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil
reais) disponha dos benefícios destinados às Microempresas e Empresas de
Pequeno Porte, o que gera certa restrição à competitividade.
Ao analisar as
alterações expostas reflete-se sobre o eventual intuito do legislador em
combater as empresas que tenham desenquadrado e não formalizado o
desenquadramento perante a junta comercial, mas que desejam, irregularmente, se
valer dos benefícios destinados às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte.
As referidas
alterações, no entanto, na prática, representam uma infelicidade por parte do
legislador, que antecipou os efeitos do desenquadramento e tolheu os benefícios
destinados às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte de forma prematura.
Assim, espera-se o
aprimoramento dos dispositivos para se evitar a injusta restrição à
competitividade causada às Microempresas e às Empresas de Pequeno Porte pela
Nova Lei de Licitações.
Autores:
*Homero Silva Neto é bacharel em
Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Advogado. Sócio do
Gonçalves, Macedo, Paiva e Rassi (GMPR) Advogados. Pós-graduado em licitações e
contratos administrativos pelo Instituto Goiano de Direito. Contato: homero@gmpr.com.br.
*Lumilla
Daher é bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás.
Advogada. Sócia do Gonçalves, Macedo, Paiva e Rassi (GMPR) Advogados.
Contato: ludmilladaher@gmpr.com.br.
Referência
Acórdão
1797/2014-Plenário - TCU.