A reforma
tributária, em curso no Congresso, promete transformar profundamente o sistema
tributário-fiscal brasileiro. Entre os temas de maior complexidade, destacam-se
os impactos para o Simples Nacional e a Zona Franca de Manaus, duas
particularidades que oferecem incentivos críticos para o desenvolvimento
econômico. A questão que se impõe é: como essas duas estruturas serão afetadas
e o que as empresas devem fazer para se preparar?
O Simples Nacional,
regime especial para pequenas e médias empresas, é indispensável para a
economia brasileira. Atualmente, ele simplifica o recolhimento de tributos
federais, estaduais e municipais, facilitando a vida de milhões de
empreendedores. Contudo, a reforma tributária ainda gera dúvidas em muitos
contribuintes, especialmente no que diz respeito à integração com o novo
sistema de tributação, como o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a
Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS).
Uma das principais
preocupações das empresas do Simples é a perda de competitividade. Quando essas
empresas atendem ao consumidor final, o impacto da reforma é minimizado, pois
não há transferência de créditos nessa hipótese. No entanto, o cenário é
diferente para aquelas que atuam como fornecedoras. Essas empresas, por
enquanto, correm o risco de se tornarem menos atraentes, uma vez que o Simples
Nacional não transfere a totalidade dos créditos tributários aos seus clientes.
Ao elaborar o PLP
68/2024, o governo previu uma alternativa para esse impasse: as empresas
optantes pelo Simples Nacional poderão optar por apurar e recolher o IBS e a
CBS pelo regime regular desses dois tributos, ou seja, fora do DAS (Documento
de Arrecadação do Simples Nacional), tornando-se aptas para apropriação e
transferência integral do crédito tributário, o que as colocará em pé de
igualdade com outras empresas. Todavia, é importante que os estudos da reforma
tributária em discussão no Congresso se atentem para uma possível elevação da
carga tributária desse segmento, que corresponde a uma parcela significativa
das empresas.
Impacto da reforma
na ZFM
A Zona Franca de
Manaus, por sua vez, enfrenta um desafio ainda mais complexo. Criada como uma
política de desenvolvimento regional, a ZFM oferece uma série de incentivos
fiscais como isenção do Imposto de Importação (II); isenção para produtos
industrializados (IPI); diversas reduções e alíquotas diferenciadas para
Cofins; reduções do IRPJ; diferimento, isenções e reduções de ICMS, entre
muitos outros. No entanto, com a reforma tributária, surge a dúvida sobre a
manutenção desses benefícios.
Em princípio,
guardadas as devidas exceções, o PLP 68/2024 propõe diversas medidas
incentivadas para manter a ZFM, dentre as quais destacamos as reduções a
zero das alíquotas do IBS e da CBS incidentes sobre operação originada fora
dela que destine bem material industrializado de origem nacional a contribuinte
estabelecido dentro da ZFM ou incidentes sobre operação realizada por indústria
incentivada que destine bem material intermediário para outra indústria
incentivada na ZFM; a suspensão da incidência do IBS e da CBS na importação de
bem material realizada por indústria incentivada para utilização na ZFM ou a
isenção quando os bens importados forem consumidos ou incorporados no processo
produtivo; a redução a zero das alíquotas do IPI relativa a produtos
industrializados na área da ZFM; créditos presumidos; entre outros.
Contudo, embora
exista esse tratamento diferenciado da ZFM na reforma tributária, é essencial
que os segmentos econômicos localizados nessa região se atentem para possíveis
prejuízos, pois o novo arcabouço tributário pode não garantir a mesma paridade
de incentivos que o sistema atual. A questão, portanto, consiste em saber se a
reforma garantirá incentivos semelhantes aos que existem hoje ou se as empresas
serão levadas a migrar para outras regiões, onde os custos possam ser mais
baixos, mesmo sem incentivos fiscais. Há um risco de desindustrialização da região,
o que pode agravar as desigualdades socioeconômicas no nosso país.
Além disso, setores
estratégicos, como o de eletroeletrônicos, que se beneficiam fortemente da
ZFM, podem perder competitividade internacional caso os incentivos
fiscais sejam reduzidos. A manutenção de benefícios ligados ao comércio
exterior continua sendo um componente fundamental para garantir que o Brasil
continue competitivo no mercado global.
Recomendações para
empresas
Diante desse cenário
de incertezas, tanto as empresas do Simples Nacional quanto as da Zona Franca
de Manaus devem adotar uma postura proativa para as possíveis mudanças.
Empresas do Simples
Nacional: A chave será uma análise detalhada de sua posição no mercado. Se a
empresa atua predominantemente no atendimento ao consumidor final, o impacto da
reforma tende a ser menos significativo. No entanto, se for fornecedora de
outras empresas, será essencial calcular se vale a pena optar pelo regime
regular do IBS e da CBS, que permitirá a transferência de crédito, ou se é mais
vantajoso permanecer no Simples Nacional, mesmo com possíveis perdas de
competitividade.
Empresas da Zona
Franca de Manaus: Para estas, o foco deverá estar na análise
dos benefícios fiscais que serão preservados ou alterados pela
reforma. Além disso, será crucial avaliar o custo-benefício de continuar
operando na região, considerando fatores como custo de mão de obra, logística e
incentivos fiscais. A migração para outras regiões só deverá ser considerada
caso as vantagens fiscais da ZFM sejam efetivamente reduzidas.
Tanto para o Simples
Nacional quanto para a Zona Franca, a reforma tributária traz desafios
significativos que exigem uma preparação cuidadosa por parte das empresas.
Embora existam alternativas propostas para minimizar os impactos, é importante
que os empresários façam análises detalhadas e reavaliem suas estratégias de
operação e tributação.
As mudanças podem
afetar a competitividade e, em alguns casos, até mesmo a viabilidade de
negócios em regiões ou segmentos que historicamente se beneficiaram de regimes
tributários especiais. Por isso, acompanhar de perto o andamento da reforma e
adotar medidas preventivas serão passos essenciais para garantir a
sustentabilidade das operações no futuro.
Autor: Vitório Rafante, especialista tributário da
Synchro.