Cláusula previa fornecimento de dados
pessoais considerados sensíveis
Resumo:
· A norma coletiva previa o repasse
de dados pessoais de empregados à empresa gestora de um cartão de descontos.
· A empresa justificou que deveria
zelar pela privacidade de seus empregados.
· Segundo a 1ª Turma, a exigência é
ilegal porque não houve consentimento dos trabalhadores.
A Primeira Turma do Tribunal
Superior do Trabalho rejeitou recurso de um sindicato dos empregados, que
pretendia que uma tradicional Associação enviasse a uma empresa administradora
de cartão de descontos dados pessoais de seus empregados. Segundo o colegiado,
a medida fere a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD - 13.709/2018),
por se tratar de privacidade, direito fundamental indisponível.
Dados iriam para administradora do
cartão
As convenções coletivas da categoria vigente entre 2019 e 2023 previam
um benefício chamado "Bem-Estar Social", cujo objetivo seria conceder
vantagens por meio de um cartão de descontos administrado por um Clube de
Benefícios Sociais. Para a emissão do cartão, mediante mensalidade paga pelo
empregador, este teria de informar, por e-mail, nome completo, CPF,
telefone, e-mail, data de nascimento e nome da mãe de cada empregado.
Em junho de 2022, o sindicato ajuizou a ação informando que a associação
não vinha cumprindo essa cláusula da norma coletiva. Disse que tentou várias
vezes entrar em acordo nesse sentido, mas a instituição sempre ofereceu
resistência, recusando as tentativas de conciliação.
A associação, em sua defesa, sustentou, entre outros pontos, argumentou
que as informações exigidas eram classificadas pela LGPD como "dados
sensíveis", e os empregadores, de acordo com a lei, têm o dever de resguardar
os dados pessoais de seus funcionários e zelar pela sua privacidade.
Sem sucesso na primeira e segunda instância, o sindicato tentou a
análise do caso pelo Tribunal Superior do Trabalho, sustentando que a convenção
coletiva de trabalho reflete a realidade e os interesses legítimos dos
empregados, e a cláusula visa à melhoria dos benefícios aos trabalhadores. "É
preciso garantir a prevalência da vontade coletiva expressa na cláusula
normativa", defendeu.
Acordo coletivo não pode dispor
sobre direitos indisponíveis
Para relator do recurso, ministro Amaury Rodrigues, a exigência é
ilegal. Ele explicou que a LGPD, em sua parte geral, entrou em vigor em agosto
de 2020 e prevê que o tratamento de dados pessoais exigirá o consentimento do
seu titular - no caso, dos empregados da associação. Não se aplica ao caso, a
seu ver, a tese do Supremo Tribunal Federal (Tema 1.046) sobre a validade das
normas coletivas. "O que se discute são os direitos relacionados à privacidade
de dados pessoais dos empregados", afirmou, lembrando que a proteção específica
à intimidade e à vida privada é um direito indisponível, que não pode ser
negociado.
A decisão foi unânime.
Nota M&M: Destacamos que esta decisão foi aplicada neste processo
específico, e pode servir como um norteador para futuras sentenças. Porém,
situações semelhantes poderão ter decisões diferentes, especialmente nas
esferas de primeiro e segundo graus.
Fonte: Tribunal
Superior do Trabalho, Processo: Ag-AIRR-1000888-31.2022.5.02.0088, com edição do texto e
"nota" da M&M Assessoria Contábil