É cediço que a
execução é uma das fases mais sensíveis do processo trabalhista, momento em que
deve se empreender esforços para a quitação do respectivo crédito, sem, porém,
comprometer a capacidade financeira do devedor que, não raras vezes, tem
dificuldade de conciliar o pagamento das condenações com a manutenção de sua
própria atividade produtiva.
Nesse sentido, e até
mesmo por desconhecimento, as partes deixam de se utilizar de novos mecanismos
que podem contribuir para a solução do problema, a exemplo do Pept (Plano
Especial de Pagamento Trabalhista).
Mas o que seria
exatamente o Pept e suas vantagens inclusive para o Poder Judiciário, para além
dos requisitos para este procedimento possa ser adotado por empresas que se
encontram hoje em dificuldades financeiras?
Com efeito, o Pept
visa dar efetividade às decisões judiciais e, de igual forma, garantir a
continuidade da atividade econômica, com o pagamento equânime e parcelado dos
débitos trabalhistas pelas empresas em favor de uma coletividade de credores. O
parcelamento poderá ser fixado em período e montante variáveis, incluindo
estimativa de juros e correção monetária até seu integral cumprimento [1].
Por certo,
considerando importância do assunto que visa, de um lado, a satisfação do
crédito trabalhista de forma célere e eficaz e, de outro, a manutenção da
atividade econômica empresarial, o assunto foi indicado por você, leitor(a),
para o artigo da semana, na coluna Prática Trabalhista da
revista Consultor Jurídico (ConJur) [2],
razão pela qual agradecemos o contato.
Legislação
Do ponto de vista
normativo, o Provimento nº 4/GCGJT, de 26 de setembro de 2023 [3], em seus artigos 154 a 177, regulamenta o procedimento
de reunião de execuções e, dentre eles, encontra-se o Plano Especial de
Pagamento Trabalhista (Pept). Além disso, os Tribunais Regionais do Trabalho
também têm a prerrogativa de estabelecer as suas próprias normas para
regulamentar tal procedimento de reunião de execuções, tudo com o objetivo de
alcançar soluções céleres e eficazes para o seu fiel cumprimento.
Lição de
especialista
Oportunos são os
ensinamentos de Gabriel Henrique Santoro [4]:
"Com o fito de
estabelecer procedimento para reunião de execuções, o C.TST definiu que o
Procedimento de Reunião de Execuções si dividiria em dois planos: 1) Plano
Especial de Pagamento Trabalhista (Pept), que tem como escopo o parcelamento do
débito - objeto do presente estudo -, e o Regime Especial de Execução Forçada
(Reef), destinado exclusivamente aos trâmites expropriatórios.
Em ambos os Planos se adota como premissa o caráter essencialmente conciliador
da Justiça do Trabalho; a duração razoável do processo; a eficiência
administrativa e economia processual; além do pagamento igualitário dos
créditos e a necessidade de preservação da função social da empresa.
Quanto ao modo de criação dos órgãos em cada Tribunal, o Provimento garante que
cada Regional terá discricionariedade para implantar de acordo com o seu padrão
organizacional, apenas devendo respeitar como atribuições do juízo
centralizador o acompanhamento do processamento do Plano; a identificação dos
grandes devedores no âmbito dos Tribunais Regionais que apresentem potencial
para a reunião de execução e por fim, a coordenação de ações e programas
especiais que tenham como o objetivo a efetividade das execuções."
Requisitos
necessários
De acordo com o
artigo 159 do Provimento nº 4/GCGJT, de 26 de setembro de 2023, para que seja
feita a apreciação preliminar do pedido de instauração do Pept, alguns
requisitos devem ser atendidos, a saber:
especificar o valor
total da dívida, instruindo o pedido com a relação de processos em fase de
execução definitiva, com valores liquidados, organizados pela data de
ajuizamento da ação; a(s) vara(s) de origem; os nomes dos credores e
respectivos procuradores; as garantias existentes nesses processos, inclusive
ordens de bloqueio e restrições; as fases em que se encontram os processos; os
valores e a natureza dos respectivos débitos, devidamente atualizados,
consolidando esses relatórios por Tribunal Regional, quando for o caso;
apresentar o plano
de pagamento do débito trabalhista consolidado, incluída a estimativa de juros
e de correção monetária até seu integral cumprimento, podendo o pagamento ser
fixado em período e montante variáveis, respeitado o prazo máximo de 6 (seis)
anos para a quitação integral da dívida;
assumir, por
declaração de vontade expressa e inequívoca, o compromisso de cumprir
regularmente as obrigações trabalhistas dos contratos em curso, inclusive as
decorrentes de verbas rescisórias devidas aos empregados dispensados ou que se
demitirem;
relacionar,
documentalmente, as empresas integrantes do grupo econômico, as quais assumem
responsabilidade solidária pelo adimplemento das obrigações relativas ao
montante global obtido na reunião dos processos em fase de execução definitiva
perante o Tribunal Regional, independentemente de, em qualquer fase dos
processos, terem figurado no polo passivo;
ofertar garantia
patrimonial suficiente ao atendimento das condições estabelecidas, a critério
de cada Tribunal Regional, podendo recair em carta de fiança bancária ou seguro
garantia, bem como em bens próprios ou de terceiros - desde que devidamente
autorizados pelos proprietários legais, hipótese em que deverão ser
apresentadas provas de ausência de impedimento ou oneração dos bens, cujas
alterações na situação jurídica deverão ser comunicadas pelo interessado de
imediato, sob pena de cancelamento do plano e impossibilidade de novo
requerimento de parcelamento pelo prazo de 2 (dois) anos;
apresentar balanço
contábil, devidamente certificado por contador, bem como declaração de imposto
de renda, em que se comprove a incapacidade financeira de arcar com a dívida
consolidada, com efetivo comprometimento da continuidade da atividade
econômica; VII - apresentar renúncia, condicionada à aprovação do PEPT, de toda
e qualquer impugnação, recurso, ação rescisória ou incidente quanto aos
processos envolvidos no plano.
Casos práticos
Um caso conhecido
envolvendo o Pept aconteceu junto ao Tribunal Regional do Trabalho da 2ª
Região [5], na qual o clube de futebol, Associação
Portuguesa de Desportos, homologou diversos acordos, honrando, assim, inúmeros
créditos trabalhistas. No mesmo sentido, o Centro Universitário Fieo de Osasco
(Unifieo) também se utilizou de tal procedimento conciliatório, reunindo diversos
processos que estavam em fase de execução [6].
Aliás, recentemente,
uma empresa de segurança patrimonial privada busca a implementação de um
Pept [7] que, caso seja deferido pelo TRT-SP,
solucionará mais de 800 execuções em curso, para além da manutenção dos mais de
4 mil empregados ativos, evitando, com isso, a eventual instauração de um juízo
falimentar que afastaria, inclusive, a competência material da Justiça do
Trabalho para dirimir o pagamento dos créditos dos trabalhadores.
Conclusão
É sabido serem
recorrentes os casos em que as empresas, diante da perda da capacidade de
gerenciar os seus passivos judiciais trabalhistas, acabam sofrendo diversas
penhoras sobre suas receitas e faturamento que, ao final, comprometem a
continuidade de suas atividades econômicas. Neste cenário é que o Ppet, por
viabilizar justamente o parcelamento da dívida, traz solução imediata para que
os devedores tenham melhores condições de cumprir o plano proposto, trazendo,
portanto, solução aos conflitos judiciais.
Em arremate, impende
destacar que qualquer executado poderá se valer do Pept, desde que demonstre
que os atos de constrição (penhoras ou ordens de bloqueio de valores) coloquem
em risco o regular exercício da própria atividade econômica, cujo procedimento
torna a Justiça do Trabalho grande protagonista de fazer cumprir o seu papel
conciliador, pois, a um só tempo, soluciona o pagamento de milhares de dívidas
trabalhistas e viabiliza a função social das empresas, a partir da manutenção
dos postos de trabalho.
[1] Disponível aqui.
[2] Se você
deseja que algum tema em especial seja objeto de análise pela Coluna Prática
Trabalhista da ConJur, entre em contato diretamente com os colunistas
e traga sua sugestão para a próxima semana.
[3] Disponível aqui.
[4] O Plano de
Execução Especial Como Forma de Efetivação dos Direitos Trabalhistas.
Disponível aqui.
[5] Disponível aqui.
[6] Disponível aqui.
[7] Disponível aqui.
Autores:
Ricardo Calcini, é professor, advogado, parecerista e
consultor trabalhista, sócio fundador de Calcini Advogados, com atuação
estratégica e especializada nos tribunais (TRTs, TST e STF), docente da
pós-graduação em Direito do Trabalho do Insper, coordenador trabalhista da
Editora Mizuno, membro do comitê técnico da revista Síntese Trabalhista e
Previdenciária, membro e pesquisador do Grupo de Estudos de Direito
Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social, da Universidade de São Paulo
(Getrab-USP), do Gedtrab-FDRP/USP e da Cielo Laboral.
Leandro Bocchi de Morae, é advogado de Calcini
Advogados. Graduação em Direito pela Universidade Braz Cubas. Especialista em
Direito Material e Processual do Trabalho pela Escola Paulista de Direito.
Especialista em Direito Contratual pela PUC-SP. Especialista em Diretos Humanos
e Governança Econômica pela Universidade de Castilla-La Mancha (Espanha).
Especialista em Direitos Humanos pelo Centro de Direitos Humanos (IGC - IUS
Gentium Coninbrigae), da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
(Portugal). Pós-graduando em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da
USP (Universidade de São Paulo). Pesquisador do Núcleo de pesquisa e extensão:
"O Trabalho Além do Direito do Trabalho" do Departamento de Direito
do Trabalho e da Seguridade Social da USP, coordenado pelo professor Guilherme
Guimarães Feliciano.