Em tempos de hiper conexão, as artes nos
lembram de algo essencial: não basta formar pessoas conectadas, precisamos
formar pessoas completas
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Em um mundo cada vez mais conectado, e
muitas vezes sobrecarregado de estímulos digitais, cresce o debate sobre a
importância de uma formação verdadeiramente integral para crianças e jovens. É
notória a importância das competências digitais para que seja possível eleger
"como" e "quando" a tecnologia tem espaço no processo de ensino e aprendizagem.
Mas há outras habilidades igualmente urgentes no século XXI: criatividade,
abstração, capacidade de concentração e persistência. Essas competências são,
muitas vezes, tratadas como "soft skills", mas não há nada de suave na sua
importância.
A própria OCDE (Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico), ao avaliar a capacidade dos estudantes
de gerar ideias originais e soluções inovadoras, revelou que, embora 87,4% dos
estudantes brasileiros digam gostar de aprender coisas novas, dado acima da
média internacional, 54,3% ficaram em níveis em que costumam ter ideias de
temas óbvios e um engajamento mínimo com tarefas.
Ou seja, há entusiasmo, mas falta
preparo - e isso revela um desafio profundo. Nesse contexto, as artes
desempenham um papel fundamental. Elas não são um "acessório" da educação, mas
sim um eixo estruturante da formação humana.
Imaginemos uma escola tradicional. É
provável que nos lembremos da banda formada nas aulas de música, das exposições
de telas nos corredores, das peças de teatro, das danças de fim de ano e até
das visitas a museus e centros culturais da cidade. Essas experiências
constroem repertório, despertam sensibilidade e desenvolvem, de forma
intencional, habilidades para a vida e para o trabalho.
A criatividade, alicerce das disciplinas
artísticas, permite que os alunos explorem diferentes perspectivas, desenvolvam
empatia e criem soluções originais para desafios complexos. Profissionais de
áreas como design, inteligência artificial, engenharia biomédica e
desenvolvimento de jogos precisam tanto da lógica matemática quanto da
estética, da comunicação visual e da capacidade de imaginar o que ainda não
existe. Essa interdependência entre técnica e criatividade é reforçada pelo
relatório "Futuro do Trabalho", realizado pelo Fórum Econômico Mundial em
parceria com a Fundação Dom Cabral.
O estudo mostra, claramente, que as
habilidades necessárias para encarar os desafios dos próximos anos exigem
pensamento analítico (69%), resiliência, flexibilidade e agilidade (67%),
liderança e influência social (61%) e pensamento criativo (57%). Esse viés mais
humanizado é, de fato, essencial para as próximas gerações.
Integrar as artes à formação das
crianças e jovens não é apenas uma escolha pedagógica, mas um compromisso com a
formação de indivíduos completos, preparados para atuar de maneira
significativa na sociedade. E, para que isso se concretize, é fundamental
investir na formação dos professores. É preciso capacitá-los para que utilizem
as ferramentas digitais de forma integrada, transitando com mais naturalidade
entre exatas e humanas.
Metodologias ativas e uma infraestrutura
tecnológica adequada tornam o ensino mais dinâmico, inclusivo e engajador - e
são aliadas poderosas na redução das desigualdades educacionais e, futuramente,
no mercado de trabalho. Em tempos de hiper conexão, as artes nos lembram de
algo essencial: não basta formar pessoas conectadas, precisamos formar pessoas
completas.
Autora: Lia Glaz é diretora-presidente da Fundação
Telefônica Vivo.