Recentemente, o STJ enfrentou um tema
sensível, mas cada vez mais recorrente na prática societária: a forma de
apuração dos haveres de um sócio que se retira da sociedade. No julgamento
relatado pelo ministro Marco Aurélio Bellizze, uma advogada deixou o escritório
de advocacia do qual era sócia e requereu o pagamento da sua participação com
base no valor real da sociedade, defendendo que se levasse em conta a
clientela, a reputação e os lucros futuros do escritório. Os sócios
remanescentes, no entanto, sustentaram que o contrato social previa
expressamente que o pagamento seria feito com base no valor nominal das cotas -
ou seja, pelo valor original aportado, sem qualquer valorização.
O STJ deu razão à tese dos sócios
remanescentes e reforçou que, especialmente nas sociedades simples, como é o
caso das sociedades de advogados, não se aplica a lógica empresarial
tradicional de avaliação baseada em fundo de comércio ou expectativa de lucro.
A Corte ressaltou que essas sociedades não possuem finalidade lucrativa no
sentido comercial e, portanto, sua avaliação patrimonial não pode ser conduzida
como se fossem sociedades empresárias. Mais do que isso, o Tribunal reafirmou a
importância do respeito aos contratos e à autonomia privada: se os sócios
estabeleceram de forma clara e válida, no contrato social, os critérios de
pagamento em caso de retirada, não cabe ao Judiciário reformular esse pacto.
Esse entendimento sinaliza uma tendência
consolidada no Poder Judiciário brasileiro: o fortalecimento da força normativa
dos acordos de sócios e a valorização da segurança jurídica nas relações
empresariais e profissionais. Embora o caso analisado envolvesse uma sociedade
simples, o raciocínio adotado pelo STJ também vem sendo aplicado com frequência
nas sociedades empresárias, em que cláusulas contratuais sobre valuation,
retirada, sucessão e solução de impasses societários têm sido respeitadas e
executadas segundo a vontade previamente ajustada entre as partes.
Com isso, o STJ deixou claro que os
contratos societários, quando válidos e firmados de forma livre e consciente,
devem ser cumpridos nos exatos termos acordados. A decisão reforça a
importância de se redigir cuidadosamente os contratos e acordos de sócios, pois
eles têm sido cada vez mais reconhecidos como instrumentos centrais de
definição da vontade societária - inclusive em litígios judiciais.
Autor:
Flávio Pinheiro Neto. Advogado especialista em Direito Empresarial e
sócio-fundador do escritório Flávio Pinheiro Neto Advogados.
Fonte:
https://www.migalhas.com.br/depeso/435528/stj-retirada-de-socio-deve-seguir-criterios-do-acordo-firmado