Resumo:
Em
decorrência de um ponto controvertido fixado pelo condutor judicial ou
arbitral, apresentaremos uma breve análise sobre a importância dos precedentes
jurídicos e o planejamento de uma perícia contábil, ou seja, da ação de
planejar a perícia para a sua realização em um laboratório de perícia
forense-arbitral, em função da importância dos precedentes técnicos e da
possibilidade de mudanças no padrão decisório standard aplicado.
E
para tal, a título de exemplo, será utilizada uma situação vinculante aplicada
às reservas contidas no patrimônio líquido, em relação às demandas de apuração
de haveres.
Palavras-chave: #Perícia
contábil. #Planejamento de uma perícia contábil. #Precedente jurídico.
#Distinção entre precedente, jurisprudência e enunciado. # Precedentes
técnicos.
1.
Introdução
O
objetivo deste artigo é demonstrar sucintamente a necessidade de se considerar
os precedentes jurídicos, a jurisprudência e os enunciados dos tribunais no
planejamento da execução de uma perícia contábil, quando isto for grafado na
fixação dos pontos controvertidos, sem que tal fato venha a interferir no
direito de ampla defesa e do contraditório. Até porque, nos laboratórios de
perícias contábeis forense-arbitrais, surgem os precedentes técnicos
científicos, que podem atestar a validade ou a rejeição de uma tese ou de uma
contratese.
2.
Desenvolvimento
A
título de um exemplo de uma possível mudança da aplicação automática da íntegra
dos julgados vinculantes por um juiz monocrático ou por um colegiado julgador,
tem-se a inclusão indistintamente de todas as reservas, na apuração de haveres.
Exemplo este que tem por objetivo evitar o enriquecimento indevido do sócio
retirante pela distribuição oriunda da divisão de todas as reservas, portanto,
entre elas, a reserva de contingência; art. 195 e 202 da Lei 6.404/1976; que é
um fato totalmente distinto da reserva de capital. Uma vez que, se a avaliação
dos haveres deve ser feita com base no patrimônio líquido, nele existe a
hipótese de se encontrar dois tipos ou mais tipos de reservas. E a reserva de
contingências, art. 195 da Lei 6404/1976, que é aquela que foi criada pela
vontade dos sócios, para a formação de um fundo de reserva, com a finalidade de
compensar, em exercício futuro, a diminuição do lucro decorrente de perda
julgada provável, cujo valor possa ser estimado. Logo, trata-se de um item do
PL, contingenciado por estar sujeito à ocorrência ou não, de fato julgado
possível. Segue o exemplo do julgado vinculante:
(REsp
130.617?AM, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em
18?10?2005, DJ 14?11?2005, p. 324). Superior Tribunal de Justiça (.) II - O
fundo de comércio e o fundo de reserva instituído pela vontade dos sócios
integram o patrimônio da sociedade e, por isso, devem ser considerados na
apuração dos haveres, por ocasião da dissolução, sem que a sua inclusão
caracterize julgamento extra petita.
À
luz da ciência da contabilidade, é despicienda e temerária, a inclusão nos
haveres de parcela correspondente às reservas de contingências. A conclusão
deste signatário, pode ser confirmada ou rejeitada em exames de um laboratório
de perícia forense-arbitral.
O
plano de trabalho do perito é ação de planejar a perícia. E após avaliar os
elementos do processo, litígio, e estando seguro quanto às tarefas, análises
técnicas e análises científicas, o perito vai ao planejamento do seu labor, a
ser executado no laboratório de perícia forense-arbitral, e focaliza o objeto
de verificação, a forma, as técnicas e procedimentos[2] a serem adotados no referido objeto,
o método científico a ser empregado, o tempo de trabalho, a divisão das
tarefas, a necessidade das citações bibliográficas[3], as pesquisas etc.
Cada
quesito não indeferido pelo condutor da lide e ponto controvertido têm sua
forma específica de serem observados. O planejamento deve orientar o perito e
sua equipe, sobre o que fazer, a fim de que se possa chegar a uma conclusão
adequada sobre a veracidade dos atos e fatos alegados, que tem como referente
as provas carreadas aos autos.
Realizado
o planejamento e estando depositados os honorários periciais, passa-se à
execução da perícia, é comunicado aos assistentes e às partes, com antecedência
mínima razoável, e prevista no CPC, o início do labor do perito.
É
possível que o ponto controvertido de uma demanda seja fixado em decorrência de
um enunciado e até mesmo de, um precedente jurídico que deve ser utilizado como
elemento para o planejamento do labor do perito.
Um
precedente é uma decisão jurídica de um colegiado, desembargadores ou
ministros, que é considerado como fonte de direito para casos de disputas
judiciais semelhantes, que venham a ocorrer ou ocorreram posteriormente à
decisão tida como precedente. Diferencia-se da jurisprudência que representa um
conjunto de decisões relativas a um mesmo assunto postulado em juízo.
Assim como também se diferencia de um enunciado que é um entendimento do
Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça em julgamentos
repetitivos sobre um determinado assunto, sendo este enunciado uma fonte de
direito vinculante para os juízes.
Sem
embargos à importância de um enunciado ou de uma jurisprudência pacificada,
deve o perito considerar que estas fontes referenciais de direito podem ser
modificadas ou afastadas, por força do § 4° do art. 927 do CPC/2015, portanto,
não são uma verdade absoluta. É importante o fato de que a perícia contábil
está adstrita às questões técnicas científicas, inclusive pode criar, se for o
caso, um precedente científico contábil, que se representa à luz da
literatura especializada[4] e
da ciência da contabilidade, pari passu com
a teoria pura da contabilidade:
Uma
possibilidade (premissa) admitida à luz de um caso estudado em laboratório,
cujo núcleo essencial pode servir como diretriz para casos reais. É composto
das circunstâncias de experiências que embasam a questão, e tem como tese aspectos
essenciais assentados na motivação da epiqueia contabilística. Um precedente,
cuja aplicação seja reiterada pode virar inclusive uma regra, a qual
passa a orientação de que prevalecerá em casos análogos. Um precedente existe
para negar ou dar provimento a uma pesquisa ou estudo. Pode ocorrer que de tão
dominante, um precedente científico transforme-se em um fato consuetudinário do
escol dos doutrinadores contábeis.
Assim,
diante da teoria do precedente científico, dos testes realizados nos laboratórios
de perícia forense-arbitral, a função de uma inspeção pericial contábil deve
ser reforçada, identificando exatamente as questões de fato que se reputam como
essenciais na busca da verdade, justamente porque a fundamentação para a
utilização do precedente será a norma geral, um modelo de conduta para as
perícias contábeis.
Por
força do artigo. 138 do CPC/2015, o juiz ou o relator, considerando a
relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda, e a
repercussão social da controvérsia, poderá, por decisão irrecorrível, de ofício
ou a requerimento das partes ou de quem pretenda manifestar-se, solicitar ou
admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade
especializada, tida como amicus curiae, amigo
da corte, para peticionar com o objetivo de contribuir para a elucidação de
possíveis alterações de uma posição vinculante dos tribunais.
Cabe
ao perito, diante de um caso em concreto, esclarecer aos julgadores, a
distinção entre fundo de reservas, que é um gênero constante do grupo de contas
do patrimônio líquido, e os tipos que o constituem, como, por exemplo, a
reserva de contingência que tem funções distintas das outras reservas.
3.
Considerações finais
O
artigo pretendeu demonstrar no campo da verdade contábil científica, à luz do
princípio da epiqueia contabilista, os motivos ou as principais razões para que
um precedente jurídico, jurisprudência, ou enunciado do tribunal, não venha a
prejudicar a ampla defesa e o contraditório técnico. Como exemplo da inclusão
de todas as reservas na apuração dos haveres, a reserva de contingência, não
deve compor a apuração dos haveres, até que a situação que a criou, seja
confirmada ou não, em prestígio à vedação do enriquecimento sem causa.
Um
precedente técnico, baseado no conhecimento da ciência da contabilidade e em
exames laboratoriais que foi submetido ao contraditório técnico, é deveras
importante, para que um tribunal possa embasar a manutenção, ou não, de uma
decisão de fatores vinculantes, à luz de um precedente científico contábil,
para fins de uma eventual superação do entendimento vinculante anterior, desde
que sejam atendidos todos os pressupostos legais.
E
por derradeiro, é possível a alteração de tese jurídica adotada em precedentes
jurídicos, jurisprudência e enunciados, aplicados em julgamento de casos
supostamente repetitivos e análogos, por força da fundamentação adequada e
específica a um caso em concreto, à luz da ciência, considerando os princípios
da segurança jurídica e da isonomia. É uma decorrência da supremacia da ciência
e da existência de distinção entre a questão técnica discutida no processo e o
padrão decisório standard aplicado. Portanto,
manter decisões contra o conteúdo dos exames laboratoriais forense-arbitrais, é
manter uma posição vinculante contrária à ciência.
REFERÊNCIAS
BRASIL.
Lei 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil.
HOOG,
Wilson Alberto Zappa. Moderno Dicionário
Contábil - da Retaguarda à Vanguarda. 10. ed. Curitiba: Juruá,
2017.
______.
Prova Pericial Contábil - Teoria e Prática. 15. ed., 2018. Juruá
[2] Procedimentos periciais -
são os processos técnicos de verificação ou inspeções utilizadas no laboratório
de perícia, para a verificação de atos ou fatos patrimoniais. Verificações
estas que são realizadas pelos peritos-contadores nas inspeções, que utilizam,
além de método científico, várias técnicas, tais como: amostra-testemunha,
arbitramento, avaliação, certificação, circularização, exame, impairment, indagação, investigação, mensuração,
observação e vistoria, entre outras.
[3] Citações bibliográficas -
as citações são referências utilizadas para construir uma reflexão sobre alguma
coisa ou em reproduzir ideias, que são referenciadas para sustentar uma
hipótese ou reforçar uma ideia, ou lastrear um raciocínio.
[4] HOOG, Wilson A. Z. Moderno Dicionário Contábil. 10. ed. Curitiba:
Juruá, 2017. Assim como: HOOG, Wilson A. Z. Prova Pericial Contábil -
Teoria e Prática. 15. ed. Curitiba: Juruá, 2018.