Tenho visto acontecer em algumas empresas uma coisa que tem me deixado
preocupado. Elas vêm, literalmente abusando de seus bons clientes.
O que é isso?
Numa época de alta inadimplência; numa época em que os clientes
tornam-se a cada dia mais exigentes e até intolerantes; numa época em que a
concorrência está muito acirrada e oferecendo vantagens especiais para
"roubar" o cliente, algumas empresas e empresários parecem ter a
tentação de abusar dos seus bons clientes - aqueles que pagam em dia, que são
fiéis, que não reclamam, que aceitam calados ou mesmo que demoram a perceber
qualquer mudança na forma de agir de seus fornecedores de produtos e serviços.
Acabam, literalmente, abusando justamente dos clientes que mais
deveriam prezar e desejar manter.
Assim, como o cliente é "bonzinho" - paga em dia, não reclama, a empresa
começa a transigir na qualidade dos produtos ou serviços que presta a ele. Como
o cliente é "bonzinho" - paga e não reclama, a
empresa começa a cobrar por serviços antes não cobrados, aumentar o preço sem
aviso prévio, e outras "cositas
más" como diriam nossos
irmãos argentinos. Como o cliente é "bonzinho" a empresa literalmente "abusa" dele, pois que dos demais não pode
abusar, pois são todos uns "reclamões",
"chatos", "controlam migalhas" e certamente não aceitariam jamais
serem abusados impunemente como os "bonzinhos".
Assim, o bom cliente é penalizado pela sua tolerância e a má empresa,
sem perceber que está diante de uma bomba-relógio que explodirá a qualquer
momento, continua abusando...
O perigo de abusar dos bons clientes é que eles simplesmente não
reclamam. Eles comentam internamente em suas empresas essa infidelidade do seu
fornecedor e apenas esperam o dia de mudar. Esses clientes, mesmo deixando de
comprar de nós, jamais reclamarão. Jamais dirão a verdade. Darão uma desculpa
qualquer - que geralmente acreditaremos como sendo verdadeira - e se vão para
sempre. E o maior problema é que nós também não faremos nenhuma análise dessa
perda, achando "normal" o ocorrido pois clientes mudam mesmo de
fornecedores.... Dizemos apenas o famoso "foi
bom enquanto durou".
Assim, uma das tarefas mais importantes dos gerentes e supervisores e
mesmo de toda a empresa é constantemente estar fazendo uma análise criteriosa
de cada um de nossos clientes. Não só dos que reclamam. Não só dos que nos são
problemáticos, mas principalmente dos que não reclamam. Estarão eles realmente
satisfeitos com nossos produtos ou serviços? Não estarão eles simplesmente esquecidos,
justamente por serem bons clientes?
E esse risco ocorre em todas as áreas de uma empresa. Não só os clientes
devem ser analisados com todo cuidado. Temos também fornecedores de serviços
que não nos criam problema. Atendem prontamente, aceitam nossas propostas de
parcelamento nos pagamentos, fazem um grande esforço para nos satisfazer. Mas
como não fazem muito alarde de sua eficiência, não damos a ele o devido valor.
Achamos simplesmente que é obrigação deles fazer todo esse esforço. E aí,
abusamos deles. Atrasamos o pagamento, não damos a necessária informação para
que nos possam atender de forma ainda melhor. Muitas vezes os achamos até
ingênuos e simples demais. Deixamos seus funcionários esperando horas nas salas
de espera de nossa empresa, etc. Como eles não fazem propaganda de si próprios,
não chamam a nossa atenção. E daí, abusamos deles. Novamente corremos o risco
de um dia, quando esse fornecedor encontrar um cliente mais consciencioso,
atencioso, que pague em dia, que não abuse, nos deixar, sem muita explicação.
Eles também são silenciosos. Contarão para nós uma "santa mentira"
que acreditaremos e nos deixarão para outros fornecedores piores.
Cuidar do velho e bom cliente e do velho e bom fornecedor nem sempre é
fácil. Nem sempre percebemos. Não prestamos a devida atenção a quem não fala
alto, não reclama, não faz alarde dos bons serviços que presta ou dos clientes
que não são "chatos".
E se os chatos vencerem sempre, a verdade é que teremos em nossa empresa
somente clientes e fornecedores chatos. E aí reclamaremos. E aí começaremos a
dizer que "todo cliente é chato, intolerante"; "todo fornecedor
é um chato e incompetente".
Da mesma forma, vejo empresas que trabalham com varejo. Fazem um enorme
esforço para conquistar um novo cliente. Oferecem a eles vantagens incríveis
para conquistá-los. E os velhos clientes? E aqueles que compram nossos produtos
regularmente há anos? E aqueles que prestigiam nossas marcas em seus bares,
restaurantes, lojas há muito tempo? Esses são simplesmente esquecidos. E com a
mão direita estamos nos esforçando para conquistar novos clientes enquanto com
a mão esquerda estamos perdendo os clientes já fiéis. As solicitações do velho
e bom cliente são sempre tidas como impertinentes. Será que para conquistar um
novo cliente não estaremos oferecendo o dobro ou o triplo do que está
solicitando aquele velho e bom cliente?
Gostaria de pedir que você, leitor, fizesse um exame de consciência
empresarial e visse se você também não está caindo na tentação de abusar do seu
bom cliente, justamente aquele que paga, que não reclama, que é fiel e leal à
sua marca e seus produtos. Não faça isso. Não caia nessa tentação. Ou você
ficará sem seus bons clientes que por serem "bonzinhos" talvez nem reclamem ou digam
nada a você. Mas acredite, na hora em que perceberem o seu abuso, por certo
deixarão você falando sozinho. E aí será tarde demais para reconquistá-lo.
Por Luiz Marins