O mais
importante dos serviços, a "justiça", existe pela participação cooperativa dos
diálogos entre os doutrinadores e os julgadores. É a voz da ciência ouvida, e
quase sempre considerada nos Tribunais. E os peritos indicados ou nomeados, por
serem também sujeitos do processo, participam ativamente deste diálogo, por
força normativa do CFC, NBC TP 01 (R1), de 19 de março de 2020, item 41 (.) "Tratando-se de termos técnicos
atinentes à Ciência Contábil, devem ser acrescidos dos seus respectivos
conceitos doutrinários, sentido e alcance contabilístico de cada um dos termos
técnicos".
O art. 156 do CPC/2015 determina a
obrigatoriedade do magistrado de ser assistido por peritos quando a prova do
fato depender de conhecimento técnico ou científico, e a ciência tem ligação
pétrea visceral com a doutrina. Este art. 156 do CPC/2015 imprime o princípio
do diálogo entre os doutrinadores, os julgadores e os peritos. Sendo que o art.
335 do CPC/2015 prevê a experiência técnica como meio adequado para suprir a
falta de normas, ou seja, lacunas, aplica-se a doutrina científica
especializada como base referencial a sua solução.
Existe uma expectativa dos jurisdicionados e
dos legisladores de uma afinidade real entre o notório saber jurídico dos
julgadores/peritos e a doutrina que explica a ciência e contribui para a
formação e aperfeiçoamento da jurisprudência.
A doutrina, não raro, é uma interpretação dos professores
epistemólogos, que explicam os silêncios eloquentes da legislação e soluciona
as lacunas técnico-científicas e legislativas, pois a ciência, sempre está em
evolução, o que nem sempre ocorre com a legislação.
O termo "diálogo" é usado habitualmente no meio forense,
para referir-se a um entendimento ou consenso, na busca da solução de problemas
tipicamente litigiosos nos termos da filosofia. Como uma solução, pois
historicamente, as referências aos textos doutrinários constituem, em grande
parte, a fundamentação da "retórica e dialética usadas na busca da verdade
real" pelos julgadores, particularmente na jurisprudência recente, avulta uma
tendência à inclusão de referência a textos doutrinários não só como parte da
discussão, mas também da decisão.
É adequado, entretanto, que se tenha cuidado para que a
invocação frequente da doutrina não constitua mais um episódio histórico de
"pseudociência" com a prática de falácias, pois a aplicação adequada de normas
jurídicas não pode ofender a ciência e/ou ferir o direito. Existem publicações,
que partem de premissas equivocadas que levam os seus leitores a erros, como,
por exemplo, a que erroneamente defende o uso do fluxo de caixa descontado como
critério para a precificação do aviamento, ou seja, do fundo de comércio.
Doutrina não são todos os livros, existem critérios
condicionantes para que um escrito seja considerado doutrina, como segue:
DOUTRINA - é a opinião ilibada, respeitada, sobre ciência, que lastreia
posições ou interpretações privilegiadas. Tem força de solução de conflitos,
diante de uma lacuna nas normas jurídicas positivadas, ou quando estas
representarem antinomia. Na ciência jurídica e nos tribunais, tem sentido de
suporte argumentativo para opinião de um perito, de uma defesa ou contestação,
por ser o conjunto de princípios expostos nos livros de ciência, em que se
firmam axiomas, teorias, teoremas, jurisprudência ou se fazem interpretações
sobre a ciência jurídica ou contábil. Mas, em uma acepção mais genérica
coloquial, quer significar as opiniões particulares, admitidas por um ou vários
notáveis professores, a respeito de um ponto controvertido. Isto posto, a
interpretação doutrinária consiste em uma análise crítica, via espancamento
científico dos textos legais pelos professores doutrinadores, em artigos livros
e teses em geral. A validade de uma doutrina para a solução de conflitos,
um livro, ou seja, obra da literatura especializada, que configura uma
fonte confiável e independente, logo, um conjunto de princípios e
ensinamentos que servem de base a um sistema interpretativo de solução de
questões técnicas e científicas, seja ela controvertida ou não. Não está
restrita ao fato do livro estar registrado na Biblioteca Nacional, estar
disponível para aquisição, e editado por editora com abrangência nacional ou
internacional, pois vai além. Deve ter sido mantido no mercado de forma serial
por sucessivos anos com novas edições, com as devidas atualizações; isto talvez
seja a parte mais complexa para a caracterização de uma obra como doutrina,
pois editar um livro é fácil, complexo é sua permanência continuada no mercado,
em face de interesses pedagógicos das universidades, dos profissionais de
mercado, em relação a sua leitura e pesquisas, e também aos interesses da
editora, pois se a obra não for viável e aceita, não existirá interesse em sua
manutenção[1].
A doutrina clássica e a contemporânea são usadas de
maneira privilegiada na solução de problemas jurídicos, apesar de ser
fundamental e indispensável, é apenas um dos diversos critérios de solução de
silêncios eloquentes e/ou lacunas da legislação.
A favor desta tendência contemporânea, a democracia
jurídica participativa com a doutrina, brada pelo reconhecimento de que as
diversas soluções de conflitos estão entrelaçadas com a doutrina, portanto, o
diálogo busca os meios adequados de articulação para a solução do problema. O
diálogo é o motivo notório pelo qual os juízes, árbitros, desembargadores,
ministros, peritos e advogados investem em suas bibliotecas. A base do diálogo
são os conceitos que a ciência clama, e que sustentam as teorias teoremas,
conceitos e os princípios, sendo os dicionários a base da formação de uma
biblioteca.
[1] HOOG, Wilson A. Z. Moderno
Dicionário Contábil. 11. ed. Curitiba: Juruá, 2020.
Por Prof. Me. Wilson Alberto Zappa Hoog é sócio do Laboratório de perícia forense arbitral Zappa
Hoog & Petrenco, perito em contabilidade e mestre em direito, pesquisador,
doutrinador, epistemólogo, com 46 livros publicados, sendo que alguns dos
livros já atingiram a marca de 11 e de 16 edições.
REFERÊNCIAS:
BRASIL. Lei
13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil.
______. Conselho Federal de
Contabilidade. NBC TP 01 (R1), de 19 de março de
2020. Dá nova redação à NBC TP 01, que dispõe sobre perícia
contábil.
HOOG, Wilson A. Z. Moderno Dicionário Contábil. 11. ed. Curitiba:
Juruá, 2020.