Ementa:
A contabilização dos
haveres em resolução de uma sociedade, precificado pela via do balanço de
determinação.
Introdução: A
presente Nota Técnica[1] tem por objetivo clarificar e prestar
uma orientação científica contábil, em relação à seguinte questão fática
técnico-científica contábil:
Como deve ser efetuada a contabilização dos haveres/deveres de sócio de
sociedade limitada e/ou acionista de sociedade anônima de capital fechado, que
deixa de ser sócio/acionista e passa a ser credor e/ou devedor da sociedade a
partir do pedido de retirada e precificação dos haveres pela via do balanço de
determinação nos termos do Art. 606 do CPC, nele incluído todos os ativos
e passivos a preço de saída, inclusive o fundo de comércio internamente
desenvolvido?
1.
Contextualização e os
consulentes:
Os
consulentes, representantes das sociedades limitadas e sociedades
anônimas de capital fechado, cuja identidade e dados estão protegidos pelo
sigilo, nos termos do artigo 207 do CPP e da LGPD, Lei 13.709/2018, necessitam, à luz da ciência da
contabilidade e do CC/2002, do CPC/2015 e da Lei 6.404/1976, para fins do
afastamento de interpretações ambíguas ou polissêmicas, uma pronúncia técnica,
vinculado à realidade fática-científica, no que diz respeito ao registro e
escrituração contábil dos haveres/deveres de sócio/acionista que teve seu
vínculo societário rompido.
A questão existente
tem como ponto controvertido a busca de diretrizes técnicas-científicas, no que
diz respeito a um efetivo procedimento de registro contábil, após a sociedade
ter ciência do pedido de apuração de haveres/deveres, razão pela qual tornou-se
oportuna a elaboração da presente Nota Técnica de Clarificação, para esclarecer
e propiciar os meios adequados a uma tomada de decisão para que os relatórios
contábeis reflitam fidelidade e clareza a real situação patrimonial da célula
social.
2. Principais elementos fáticos considerados:
1.
A
presente nota técnica de clarificação representa um revisionismo da nota
técnica anterior de número 18/2022, em função da evolução doutrinária.
2.
Princípio
pétreo[2] da clareza e o
da fidelidade das demonstrações contábeis-financeiras, art. 1.188 do CC/2002;
3.
Lei
6.404/1976;
4.
CPC/2015;
5.
Critério
de valorimetria que tenha lastro em um justo preço das ações a serem
reembolsadas;
6.
Método
do raciocínio lógico-contábil, oriundo da Teoria Pura da Contabilidade e suas
teorias auxiliares;
7.
Interpretação
da lei de forma epistemológica[3] pari passu com a fatores consuetudinários da
ciência da contabilidade[4];
8.
Princípio
contábil da epiqueia contabilística, que sustenta a Teoria Pura da
Contabilidade, este princípio determina uma forma de interpretação razoável ou
moderada de uma lei, ou de um direito postulado em juízo ou de um preceito da
política contábil. Logo, temos a equanimidade ou disposição de reconhecer o
direito de todas as pessoas envolvidas em uma relação, com imparcialidade e
independência de juízo científico;
9.
A
doutrina como fonte de direito e de solução de lacunas e de referência
bibliográficas, com seus conceitos, em sintonia à Normatização Brasileira da Perícia
Contábil, NBC TP 01 (R1), §41[5], editada em 2020 pelo Conselho Federal de Contabilidade.
3. Esclarecimento técnico e as suas fundamentações
Em relação à
consulta, ou seja, sobre o questionamento passamos a expor:
QUESTÃO
Como deve ser efetuada a contabilização dos haveres ou deveres de
sócio/acionistas, que deixa de ser sócio/acionista e passa a ser credor e/ou
devedor da sociedade a partir do rompimento do vínculo societário e
precificação dos haveres/deveres, pela via do balanço de determinação, nos
termos do art. 606 do CPC/2015, ou seja, lastreado no balanço especial tido
como balanço extraordinário, nele incluído todos os ativos e passivos a preço
de saída, inclusive os estoques e o fundo de comércio internamente
desenvolvido?
4. A pronúncia
Inicialmente
é necessário esclarecer que o reembolso de ações de sociedades anônimas de
capital fechado, as quais não tenham dispersão e liquidez via bolsa de valores,
cujo pedido de reembolso é proposto pela via judicial, presume-se que seguem as
determinações do CPC/2015. Pelo mesmo motivo, é o que se espera dos julgadores,
quando existe a ruptura da affectio
societatis e não existe liquidez e dispersão[6] para as ações. E por um critério de equidade e
justiça, os haveres devem ser precificados, com a inclusão do mais importante
dos ativos intangíveis, o fundo de comércio, para se evitar eventual
enriquecimento sem causa dos acionistas remanescentes e da sociedade.
A ação de dissolução parcial de sociedade
pode, também, ter como promovida uma sociedade anônima de capital fechado,
quando demonstrado, por um ou mais acionistas, desde que representem cinco por
cento ou mais do capital social, que a sociedade não preenche o seu fim social,
por força do § 2o do art. 599, CPC/2015.
O CPC/2015, art. 599 prevê que: "A ação de dissolução parcial
de sociedade pode ter por objeto (.) § 2o A ação de dissolução
parcial de sociedade pode ter também por objeto a sociedade anônima de capital
fechado (.)".
Aplica-se a regra do
direito de reembolso ao acionista dissidente. Este é um direito essencial, do
qual o acionista não pode ser privado, conforme inc. V do art. 109 da Lei 6.404/1976.
Os haveres dos acionistas, por pagamento de
ações de companhia de capital fechado, obtidos pela via do reembolso de suas
ações, §2° do art. 45 da Lei 6.404/1976, lastreado no balanço especial,
onde se incluem para apuração de haveres de acionista, relatório contábil
correto e adequado denominado de "balanço especial", o que implica em
pagamentos, sendo o primeiro pagamento: relativo à parte incontroversa dos
haveres, em sintonia ao §1° do art. 604 do CPC/2015, harmonizado com o §2° do
art. 45 da Lei 6.404/1976, e o segundo pagamento, após a precificação do
balanço especial e do trânsito em julgado[7] da peleia jurídica.
A doutrina[8] especializada na Lei 6.404/1976, apresenta o
seguinte conceito para balanço especial:
BALANÇO ESPECIAL (§ 2° do art.
45) - balanço real que prestigia e valoriza a equidade[9] contábil, onde a essência
se sobrepõe à forma, uma contraposição ao balanço patrimonial putativo[10]. Sinônimo de balanço de
determinação, é específico para a apuração dos haveres do acionista que está se
desligando da sociedade, pois determina o valor a ser reembolsado ao acionista
que se despede ou que foi expulso. Este balanço deve ser prioritariamente
elaborado por perito em contabilidade com notória capacidade e independência em
relação à sociedade e aos acionistas.
Entre os direitos pétreos do acionista que
se despede, está o de receber o justo preço pelas suas ações, que por lógica,
deve estar em simetria ao que denominamos de critério patrimonial[11].
Avulta, também, o
direito das sociedades, haveres e/ou deveres, em caso de resolução da sociedade
em relação a um ou mais sócios.
Surge então a questão dos registros
contábeis destes valores, em especial, os estoques e o fundo de comércio, os
quais estão integram os haveres ou deveres[12].
Os haveres, quando o sócio/acionista deixa
de ser proprietário e passa a ser credor, momento em que exerce o seu direito
de retirada, devem ser transferidos do patrimônio líquido, inclusive o fundo de
comércio internamente desenvolvido, cujo registro primário representa débito no
ativo intangível e crédito no Patrimônio Líquido. Hipótese da diminuição do
número de ações, seu cancelamento e alteração no estatuto social, sem a
manutenção destas ações, como em tesouraria[13].
O reconhecimento e a transferência dos
haveres ocorre por meio de débito nas respectivas contas do patrimônio líquido,
em contrapartida, a crédito no exigível a longo prazo, para após realizar o
efetivo pagamento. Esclarecemos que se o fundo de comércio, por força do art.
179[14] da Lei
6.404/1976 deve ser contabilizado quando adquirido; é lógico
que quando for pago ou a
dívida reconhecida junto ao
acionista retirante, mesmo que este fundo tenha sido desenvolvido internamente
sem aquisição junto a terceiros, sob o crivo da ampla defesa e do
contraditório, amparado em laudo de perito judicial/arbitral, também seja
contabilizado. Pois não se pode registrar a saída de caixa ou equivalente de
caixa sem a devida contrapartida, no passivo exigível a longo prazo, conta onde
o acionista está figurado como um credor da companhia. É lógico, que o não
reconhecimento do principal ativo intangível ou fundo de comércio, implica na
criação de um balanço putativo. Pois, não existe dúvida da existência do ativo
intangível, a questão a ser respondida pela perícia contábil, é se tem preço
positivo goodwill ou
negativo badwill.
O primeiro registro básico, reconhecimento
do fundo de comércio no ativo intangível e patrimônio líquido, tem a sua
precificação pelo método holístico, sendo que a parcela do fundo de comércio,
não pertencente ao sócio/acionista retirante, deve em todos os exercícios
sociais subsequentes, ser submetida ao teste de impairment of goodwill,
que significa a realização de um teste para verificar a existência de
perdas por imparidade do fundo de comércio, ou seja, diminuição do preço
original que deve ser efetuada anualmente, preferencialmente na data do
balanço, isto em harmonia ao art. 183 da Lei 6.404/1976:
No balanço, os elementos do
ativo serão avaliados segundo os seguintes critérios: (.) § 3o
A companhia deverá efetuar, periodicamente, análise sobre a recuperação dos
valores registrados no imobilizado e no intangível, a fim de que sejam
registradas as perdas de valor do capital aplicado quando houver decisão de
interromper os empreendimentos ou atividades a que se destinavam ou quando
comprovado que não poderão produzir resultados suficientes para recuperação
desse valor; II - revisados e ajustados os critérios utilizados para
determinação da vida útil econômica estimada e para cálculo da depreciação,
exaustão e amortização.
A lógica contabilista evidencia que:
para se retirar do patrimônio líquido o preço do reembolso ao
sócio/acionista retirante, em cuja composição é possível encontrarmos a
participação do sócio/acionista nas seguintes rubricas: capital social,
reservas de capital, reservas de lucros, prejuízos acumulados, ações em
tesouraria, ajustes de avaliação patrimonial, e fundo de comércio, ajuste de
preço de ativos preço de saída, entre outras; é evidente que tem que existir
tais valores contabilizados, ou seja, reconhecidos na escrituração contábil em
simetria aos princípios da Teoria Pura da Contabilidade. Sendo deveras
relevante o fato de que, a manutenção dos valores do sócio/acionista retirante,
que deixou de ser acionista e virou credor da companhia; no patrimônio líquido,
configura um balanço putativo por erro material de cognição, seja por ação ou
por omissão, e por violação dos princípios da fidedignidade[15] e da clareza[16]. E este erro material pode gerar
interpretações erradas por parte de fornecedores, instituições financeiras e
demais credores da companhia, quando for por eles analisados os indicadores de
liquidez e/ou rentabilidade. Manter no patrimônio líquido dívidas para com os
sócios, significa falsear a fidedignidade e real situação patrimonial. Os
princípios aqui referenciados, o da fidedignidade e o da clareza criam o
fenômeno da equanimidade ou disposição de reconhecer o direito de todas as
pessoas e utentes dos relatórios, que estão envolvidas em uma relação com
imparcialidade. Logo, afastada toda e qualquer influência ou interesse profano,
evitando-se excesso por uma interpretação extensiva e viciada, ambígua ou
polissêmica, para prevalecer à equidade.
Esta pronúncia foi parafraseada a partir de
nossas doutrinas: HOOG, Wilson A. Z. Lei das Sociedades
Anônimas. 7. ed., 2022, Juruá Editora, e o
livro Resolução de Sociedades e Avaliação do Patrimônio na Apuração de Haveres
ou deveres, 8 ed.
Juruá Editora, 2022.
Na hipótese de o
balanço de determinação apresentar "patrimônio líquido negativo", por
superação das dívidas em relação a soma dos bens e direito, em especial a conta
de prejuízos acumulados, mas não a única, a participação dos sócio no
patrimônio líquido negativo, representa um dever de repor as perdas, em
sintonia ao art. 1.007 do CC/2002, salvo disposição contratual em sentido
contrário. Salientando que o capital social representa a principal garantia aos
credores, e se este capital social foi corroído por prejuízos, todos os sócios
têm o dever de repor esta perda, vide art. 1.032 do CC/2002. Então os deveres
devem ser contabilizados, como um ativo circulante, débito, direito de a
sociedade receber do sócio retirante, e crédito no patrimônio líquido, mediante
pedido contraposto nos termos do art. 602 do CPC.
Na hipótese de o
balanço de determinação apresentar "patrimônio líquido positivo", por superação
do preço dos bens e direitos em relação às dívidas; deve o valor correspondente
à participação do sócio/acionista ser transferido do patrimônio líquido para o
passivo circulante em simetria aos princípios pétreos da fidelidade do balanço,
e o da epiqueia contabilística, somente assim existirá uma harmonia na
composição patrimonial, sendo que juros ou correções monetárias por
impontualidade no pagamento dos créditos, "haveres", dos sócios/acionista
retirantes, configuram despesas financeiras, porém sempre respeitando o regime
de competência para tal fato.
Exemplificando os
registros dos haveres:
|
Balanço Patrimonial antes do pedido
reembolso de ações
|
|
Ativo Circulante
|
|
|
Passivo Circulante
|
|
|
Caixa/banco
|
1.500
|
|
Haveres sócio/ acionista
|
|
|
Estoques a preço de entrada
|
500
|
|
|
|
|
Ativo não circulante
|
|
|
Patrimônio Líquido
|
2.000
|
|
Ativo Intangível
|
|
|
Capital social
|
1.000
|
|
Fundo de
comércio
|
|
|
Reservas de lucros
|
1.000
|
|
|
|
Intangível Fundo de Comércio
|
|
|
Total ativo
|
2.000
|
|
Total passivo
|
2.000
|
|
Lançamentos/Registros sócios/acionista -
reembolso dos haveres 20% sobre o PL.
|
|
Débito
|
Crédito
|
|
|
|
|
Ativo Circulante
|
|
|
|
Estoques
|
500
|
|
|
|
|
|
Patrimônio Líquido
|
|
|
|
Valorimetria do estoque a preço de
saída
|
|
500
|
|
|
|
|
Ativo Intangível
|
|
|
|
Valorimetria do Fundo de
comércio
|
400
|
|
|
|
|
|
Patrimônio Líquido
|
|
|
|
Valorimetria do Fundo de comércio
|
|
400
|
|
|
|
|
Patrimônio Líquido
|
|
|
|
Capital social
|
|
|
|
Reembolso/Haveres
|
200
|
|
|
|
|
|
Passivo Circulante
|
|
|
|
Haveres Capital Social
|
|
200
|
|
|
|
|
Patrimônio Líquido
|
|
|
|
Valorimetria do Fundo de comércio
|
80
|
|
|
|
|
|
Passivo Circulante
|
|
|
|
Haveres Fundo de comércio
|
|
80
|
|
|
|
|
Patrimônio Líquido
|
|
|
|
Reservas de lucros
|
200
|
|
|
|
|
|
Passivo Circulante
|
|
|
|
Haveres Reserva de lucros
|
|
200
|
|
|
|
|
Patrimônio Líquido
|
|
|
|
Reembolso estoque preço de saída
|
100
|
|
|
|
|
|
Passivo Circulante
|
|
|
|
Haveres estoque preço de saída
|
|
100
|
|
|
|
|
TOTAL -LANÇAMENTOS
|
1.480
|
1.480
|
|
Balanço patrimonial após pedido de
haveres
|
|
Ativo circulante
|
2.500
|
|
Passivo circulante
|
580
|
|
Caixa/banco
|
1.500
|
|
Haveres sócio/ acionista
|
580
|
|
Estoque a preço de saída
|
1000
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
Ativo não circulante
|
400
|
|
Patrimônio líquido
|
2.320
|
|
Intangível
|
|
|
Capital social
|
800
|
|
Fundo de
comércio
|
400
|
|
Reservas de lucros
|
800
|
|
|
|
Fundo de comércio
|
320
|
|
|
|
Ajuste estoque preço saída
|
400
|
|
Total Ativo
|
2.900
|
|
Total Passivo
|
2.900
|
Parágrafos de ênfase:
·
Sem
embargos ao fato de que o Balanço de Determinação não seja obrigatória a sua
escrituração no Sped contábil, os "efeitos de valorimetria" do balanço de
determinação devem ser considerados no balanço ordinário, ou seja, os
lançamentos conforme anteriormente demonstrado. Como efeitos de valorimetria
consideramos: "caixa dois", reavaliações de imobilizados com o seu IR e CS
diferidos, valorimetria do fundo de comércio, ajuste de estoque a preço de
saída, passivos ocultos ou fictícios, e ativos ocultos ou fictícios entre
outros. Sendo que à título de exemplo, a baixa da reavaliação de imobilizado ou
do preço de saída do estoque existente na data base da resolução da sociedade,
ocorre pela sua realização decorrente de alienação, isto é uma questão de
raciocínio lógico contábil, pois se o balanço ordinário que continha caixa
dois, imobilizado com preço defasado, e duplicatas pagas no passivo entre outros
incongruências ou ilusionismo, é claro que após o reconhecimento dos
haveres/deveres, não deve o balanço ordinário voltar a sua situação anterior de
putativo.
·
Os
"efeitos de valorimetria" que alicerçam o balanço extraordinário, conhecido
como Balanço de Determinação, não são simples coadjuvantes ou meros figurantes,
e sim, os verdadeiros protagonistas da real situação patrimonial, todos os
"ativos e passivos a preço de saída", que estão previstos implicitamente no
art. 606 do CPC, na doutrina e na jurisprudência.
·
Os
"efeitos de valorimetria", constantes do balanço de determinação, devem ser
escriturados respeitando-se as regras do art. 1184 do CC/2002, individuação,
clareza e caracterização do documento de suporte, além da elaboração do
balancete diário, referente à data da saída do sócio/acionista, em harmonia ao
art. 1186 do CC/2002. Sob pena de violar o princípio da fidelidade e clareza,
pois violar este princípio contábil pétreo, é muito mais grave que transgredir
uma norma qualquer, porquanto, a desatenção ao princípio representa uma
insurgência contra toda a Teoria Pura da Ciência da Contabilidade, configurando
uma subversão de valores contundentes da estrutura lógica do objeto e objetivo
da contabilidade e; uma apologia extrema ao abominável ilusionismo contábil.
Pois, a necessidade de se escriturar os efeitos do balanço de determinação
relativos a apuração de haveres, dentro do PL nos balancetes e balanços
ordinários, não se trata de uma revelação deste signatário, e sim, de uma mera
constatação, vinculada à prevalência da essência dos fenômenos patrimonais,
sobre os balanços putativos, pois se os itens, contas ou rubricas contábeis,
que compõem os haveres não estiverem escriturados no patrimônio líquido, não
existe condições lícitas de se fazer a baixa no PL e o provisionamento para o
pagamento dos haveres ao sócio retirante.
·
Sendo
que o valor incontroverso[17] dos haveres
deve ser transferido de cada uma das contas do patrimônio líquido, para o
passivo circulante - haveres de ex-sócio/acionistas, em simetria ao §1º do art.
604 do CPC. Esta data da transferência dos valores do PL para o Passivo, será a
determinada pelo art. 605 do CPC.
5.
Diagnóstico relativo ao
epicentro da questão técnica:
Chamar o fenômeno,
da escrituração dos haveres, à ordem científica contábil-jurídica, nos permite
compreender por que um juízo científico de ponderações, na sua máxima de
conhecimento tido como "sã crítica"[18], que o sócio/acionista passa a ser credor ou
devedor, portanto, deixa de ser sócio/acionista, e isto nos permite concluir
pela necessidade de se escriturar o débito, deveres, do sócio/acionista no
ativo circulante, e o crédito, haveres, no passivo circulante, bem como, os
concernentes efeitos das respectivas precificações do fundo de comércio e
ajuste do estoque a preço de saída.
6.
Encerramento:
Este documento,
representa uma Nota Técnica Contábil de Clarificação, emitida pelo laboratório
de perícia forense-arbitral, Zappa Hoog e Petrenco, sobre o fenômeno contábil,
questionado, uma vez que esta Nota Técnica afasta as ficções e esclarece os
equívocos de acepção e reconduz os fatos a uma correta interpretação contábil
científica lastreada na doutrina.
[1] Nota Técnica Contábil de Clarificação - é um
documento elaborado por um profissional contador, especializado em determinado
assunto. E é emitida quando identificada a necessidade de uma clarificação
técnica, ou seja, uma fundamentação formal e específica para oferecer uma
solução para uma tomada de decisão em um caso em concreto, evitando a partir
desta pronúncia, interpretações polissêmicas ou ambíguas.
[2] Princípio pétreo da
contabilidade - Dispositivo que equivale a um axioma, pois não pode ser
alterado, já que objetiva impedir inovações em temas vitais, como por exemplo,
a fidelidade e clareza da real situação patrimonial, onde todos os atos e fatos
patrimoniais, principalmente o fato de que todos os ativos e passivos devem
ser reconhecidos. Um princípio pétreo, como o da fidelidade e clareza, no
abrigo da teoria da substância sobre a forma, é um princípio que tem por
finalidade demonstrar a situação real, das atividades peculiaridades de uma
célula social. Representa um atributo à escrituração contábil.
[3] Interpretação epistemológica - representa um estudo
crítico dos princípios, dos teoremas, das hipóteses e dos resultados dos
diversos fenômenos e suas patologias. E surge no curso de uma investigação
científica ou na reflexão da busca de soluções de problemas, métodos e teorias.
(HOOG, Wilson A. Zappa. Moderno Dicionário Contábil.
12. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2022, no prelo.)
[4] Os fatores
consuetudinários da Ciência Contábil são os aspectos relativos aos usos e
costumes científicos, comuns à maioria dos lidadores da ciência social
contábil, situação em que a essência dos atos e fatos se sobrepõe à forma. São
as regras, princípios, convenções e normas de conhecimento notório pela maior
parte da população de contadores contemporâneos. Pelo viés da logística
contábil, estas regras ou fatores cognitivos, em sua grande maioria são
utilizados como uma forma de concordância de ideias, de opiniões entre os
provedores e repetidores da ciência. Usos e costumes levarão em consideração os
objetivos, os fins da norma, tem-se que observar a finalidade da norma
descobrindo-se a racionalidade da própria norma, qual o seu conteúdo, qual a
sua missão.
[5] NBC TP 01 (R1), §41: "Tratando-se de termos técnicos atinentes à Ciência
Contábil, devem ser acrescidos dos seus respectivos conceitos doutrinários,
sentido e alcance contabilístico de cada um dos termos técnicos, além de
esclarecimentos adicionais ou em notas de rodapé. É recomendada a utilização daqueles
termos já consagrados pela literatura contábil."
[6] Liquidez e dispersão no mercado - são dois
relevantes fatores, cuja combinação representa o estado de um bom investimento
de ações em companhias de capital aberto. O estado de "liquidez" é quando a
espécie ou classe de ação, ou certificado que a represente, integre índice geral
representativo de carteira de valores mobiliários admitido à negociação no
mercado de valores mobiliários, no Brasil ou no exterior, definido pela
Comissão de Valores Mobiliários. Já a "dispersão" é quando o acionista
controlador, a sociedade controladora ou outras sociedades sob seu controle
detiverem menos da metade da espécie ou classe de ação. A falta de liquidez e
dispersão de ações dá ao acionista dissidente de deliberação da companhia
(assembleia especial) o direito de reembolso de suas ações.
[7] Trânsito em julgado -
é um termo jurídico que tem o sentido de se referir ao momento em que
existe uma decisão, sentença ou acordão, que põe fim a uma demanda,
formando a pronúncia judicial definitiva, ou seja, não podendo mais a demanda
ser objeto de recurso.
[8] HOOG, Wilson A. Z. Dicionário de Vocabulários da Lei das Sociedades Anônimas - Lei 6.404,
de 15.12.1976. Curitiba: Juruá, 2022.
[9] Equidade -
conjunto de princípios imutáveis de justiça, que representa a essência sob a
forma. A verdade real, que leva a um critério de moderação e de igualdade,
ainda que em detrimento da forma e espanca os interesses contrários à isonomia.
[10] Balanço que aparenta
ser verdadeiro, certo, sem o ser; suposto, reputado. Este fato de que o Balanço
Patrimonial é uma peça insuficiente, é notório. HOOG, Wilson Alberto
Zappa. Prova Pericial Contábil -
Teoria e Prática. Revista e Atualizada com a NBC PP nº 1 (R1), e a NBC TP nº 1
(R1). 16. ed. Curitiba: Juruá, 2020. A doutrina revela de forma explícita as
principais causas da inutilidade do balanço para efeito da apuração dos haveres
de sócios que se desligam.
[11] Critério patrimonial - tudo o que está vinculado ao
objeto da ciência da contabilidade, o patrimônio, ou seja, a riqueza, material
ou imaterial vinculada às células sociais, (ativo, passivo e rédito). Portanto,
uma avaliação por critério patrimonial de apuração de haveres, significa uma
precificação pela via da métrica: balanço de determinação, nele incluído os
intangíveis como o fundo de comércio internamente desenvolvido. Logo,
diferencia-se de critérios financeiros, como o fluxo de caixa descontado.
Outros exemplos de critérios patrimoniais, são as avaliações do fundo de
comércio pelo método holístico, e o lucro cessante pela margem de contribuição
vinculada ao método direto e/ou o indireto. Um critério patrimonial busca o
valor patrimonial real com certeza científica. Como destaque, o art. 606 do
CPC/2015, prevê e determina como critério o valor patrimonial avaliando-se
bens, direitos e obrigações, ou seja, o ativo e o passivo, inclusive os
intangíveis, em simetria ao art. 1.031 do CC/2002, que prevê a elaboração de um
balanço especial. O egrégio Superior Tribunal de Justiça tem objetivo de
uniformizar a aplicação e a interpretação da Lei Federal. O STJ é a última
instância da Justiça para as causas infraconstitucionais de modo que a pronúncia
do STJ reflete, como a última palavra, a métrica de avaliação de quotas/ações
adotado pelo Poder Judiciário Brasileiro, pois a questão, apuração de haveres
diz respeito à Lei Federal. O STJ deixou bem claro que a apuração dos haveres
do sócio retirante deverão contemplar os bens corpóreos e incorpóreos, a fim de
que os ativos intangíveis sejam contemplados nos haveres. E que resultados
negativos não significa necessariamente que ela não tenha fundo de comércio.
Como segue: "EMENTA:
DIREITO SOCIETÁRIO. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE. APURAÇÃO DE HAVERES.
INCLUSÃO DO FUNDO DE COMÉRCIO. 1. De acordo com a jurisprudência consolidada do
Superior Tribunal de Justiça, o fundo de comércio (hoje denominado pelo Código
Civil de estabelecimento empresarial - art. 1.142) deve ser levado em conta na
aferição dos valores eventualmente devidos a sócio excluído da sociedade. 2. O
fato de a sociedade ter apresentado resultados negativos nos anos anteriores à
exclusão do sócio não significa que ela não tenha fundo de comércio. 3. Recurso
especial conhecido e provido. RECURSO ESPECIAL Nº 907.014 - MS (2006?0265012-4)
DJe 19/10/2011, MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA."
[12] Haveres e deveres de acionista retirante - a regra
é: o acionista que se desliga, deixa de ser acionista e passa a ser credor da
sociedade ou devedor. Surgindo com isto a expressão: apuração de haveres e/ou
deveres. Haveres e deveres significam a precificação do montante correto a
ser realizado, logo, liquidado. Haveres significa que o acionista que se
retira tem um crédito a receber e deveres significa que o acionista que se
retira tem um débito, como empréstimos, valores a indenizar por atos de desvio
de finalidade, entre outros, observando os termos do art. 602 do CPC/2015. Os
haveres dependem de uma avaliação por critério patrimonial de apuração de
haveres, o que significa uma precificação pela via da métrica: balanço de
determinação, nele incluído todos os ativos e passivos, e inclusive os
intangíveis como o fundo de comércio internamente desenvolvido, cujo
procedimento de valorimetria pode ser pelo método holístico, a utilização do
balanço de determinação como critério de valorimetria, é uma questão pétrea,
desde que no estatuto social não esteja pactuado um critério diverso.
[13]A manutenção de ações em
tesouraria, implica necessariamente na observação plena dos seguintes artigos:
do art. 30 da Lei 6.404/1976:
"A companhia não poderá negociar com as próprias ações. § 1º Nessa proibição
não se compreendem: a) as operações de resgate, reembolso ou amortização
previstas em lei; b) a aquisição, para permanência em tesouraria ou
cancelamento, desde que até o valor do saldo de lucros ou reservas, exceto a legal,
e sem diminuição do capital social, ou por doação(.) ;" e do
art. 45 da Lei 6.404/76: "Art.
45. O reembolso é a operação pela qual, nos casos previstos em lei, a companhia
paga aos acionistas dissidentes de deliberação da assembleia-geral o valor de
suas ações. (.) § 5º O valor de reembolso poderá ser pago à conta de
lucros ou reservas, exceto a legal, e nesse caso as ações reembolsadas ficarão
em tesouraria". Portanto, existe um condicionador e limitador
para o registro de ações em tesourarias, que é: a aquisição pela companhia das
ações do acionista retirante, para permanência em tesouraria, somente é
possível, se existir do saldo suficiente de lucros ou reservas, exceto a
reserva legal suficiente para se efetuar o reembolso, permanecendo na integra o
registro do capital social. Ou seja, é proibido as companhias adquirirem as
próprias ações, utilizado recursos do capital social, e da reserva legal,
estando implícito que o saldo de prejuízos acumulados devem ser diminuídos das
saldos das contas de reservas, e que a obtenção de empréstimos/financiamento
para aquisição das próprias ações é uma falácia, por partir de premissa
equivocada, pois empréstimos/financiamentos não são registradas como reservas
ou lucros em contas integrantes do patrimônio líquido.
[14] Lei 6.404/1976, art. 179. As contas serão classificadas do
seguinte modo: (.) VI - no intangível: os direitos que tenham por objeto bens
incorpóreos destinados à manutenção da companhia ou exercidos com essa
finalidade, inclusive o fundo de comércio
adquirido.
[15] Da fidelidade - para a contabilidade, é um princípio
que tem por finalidade demonstrar a situação real das atividades peculiaridades
de uma célula social. Representa um predicado à escrituração contábil. É uma
característica essencial do balanço patrimonial. E este princípio inclui-se na
amplitude dos princípios de contabilidade geralmente aceitos referenciado no
art. 177 da Lei 6.404/1976. E em decorrência da lógica, afirmamos que os
princípios são pré-existentes, ou seja, existem antes da legislação, e esta
legislação, em função da importância dos princípios foi moldada por eles. A
violação de um princípio é muito mais grave que a simples violação de uma lei.
Pois a desatenção a um princípio implica em uma grave ofensa, que vai além do
mandamento obrigatório, uma vez que fere todo um sistema que consubstancia o
espírito da legislação brasileira. Os princípios representam a essência dos
fatores originários e consuetudinários da ciência social da contabilidade, que
descreve a contabilidade como ela é, portanto, as verdades reais estribadas no
conhecimento da ciência da contabilidade. A priori, os princípios de
contabilidade significam os parâmetros ditos como referentes. Claudica qualquer
ideia de que a fidelidade, não se aplica na elaboração do balanço patrimonial.
[16] Clareza (art.
176 da Lei 6.404/1976) - O princípio da clareza exige que o balanço seja
organizado de forma a não se prestar a interpretações dúbias da composição dos
elementos patrimoniais e suas respectivas funções. HOOG, Wilson A. Z. Dicionário de Vocabulários da Lei das Sociedades Anônimas - Lei 6.404,
de 15.12.1976. Curitiba: Juruá, 2022.
[17] Valor Incontroverso -
valor incontroverso é aquele que não se tem dúvida, ou seja, é aquele que não é
possível contraditar por apresentar uma asseguração razoável. Como exemplo: um
balanço aprovado por todos os sócios, em assembleia ou reunião de sócios, tem o
seu patrimônio líquido, tido como um valor introvertido entre os sócios. E se
não foi aprovado por um ou mais sócios, que alegam, que o preço é superior ao
valor aprovado pela maioria, este valor, que tecnicamente o correto seria
denominado de preço, e aprovado pela maioria, é incontrovertido, sendo
controvertido apenas a diferença entre o valor aprovado e o seu excedente
alegado pelos dissidentes. O contrário também é verdadeiro, ou seja, se for
alegado pelos dissidentes que o preço é menor ao atribuído pelo balanço
aprovado, o menor preço é tido como incontroverso. Em resumo, incontrovertido,
sempre é o menor preço diante de duas ou mais precificações, o que não
significa, que o preço incontrovertido seja a verdade, ou o justo. E o preço
controvertido, para ser solucionado, depende de exame técnico-pericial
imparcial e independente das precificações alegadas. O valor incontroverso
representa o valor mínimo, entre o que sócios entendem como sendo o preço real
das quotas, portanto, este montante, incontrovertido, existe, ainda que em
valor mínimo. Sem embargos ao fato que, do preço incontrovertido dos haveres, é
possível a compensação com valores devidos pelo sócio que se desliga. A
existência de um laudo de avaliação não significa que o valor deste laudo seja
incontrovertido, pois somente será, se o laudo for aprovado por assembleia ou
reunião de sócios. A parte controvertida dos haveres e/ou deveres, pode ter
como lastro denúncias de incidentes de falsificação, como inserção de despesas
inexistentes, omissões de receitas, ocultação de ativos ou passivos. A arguição
de falsidade vem expresso no teor dos artigos 430 a 433 do Código de Processo
Civil.
[18] Sã crítica -é a operação intelectual, que constitui
em um conjunto de regras da correta compreensão do conhecimento, como: a
lógica; a experiência e testabilidade, a epistemologia, os conceitos, as
teorias, os princípios, os teoremas, as leis científicas, a legislação e as
doutrinas, que devem ser consideradas em conjunto para assegurar uma pronúncia
que seja no mínimo, equitativamente científica, provável, razoável e
proporcional, sem embargos ao fato notório de que no âmbito da ciência, a
verdade absoluta não existe, é apenas uma utopia.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei 13.105, de 16 de março de 2015.
Código de Processo Civil.
_____. Lei 6.404 de 15 de dezembro de 1976.
Dispõe sobre as Sociedades por Ações.
_____. Lei 13.709, de 14 de agosto de 2018.
Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).
_____. Conselho Federal de Contabilidade. NBC
TP 01 (R1), de 19 de março de 2020. Dá nova redação à NBC TP 01, que dispõe
sobre perícia contábil.
HOOG, Wilson A. Z. Dicionário de Vocabulários da Lei das Sociedades Anônimas -
Lei 6.404, de 15.12.1976. Curitiba: Juruá, 2022. 286 p.
_____. Lei das
Sociedades Anônimas. 7. ed., Curitiba: Juruá, 2022, no
prelo.
_____. Moderno
Dicionário Contábil. 12. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2024.
_____. Resolução
de Sociedades e Avaliação do Patrimônio na Apuração de Haveres ou deveres,
8 ed. Juruá 2022.
Autor:
Wilson A. Zappa Hoog. É sócio do Laboratório de Perícia-forense arbitral Zappa
Hoog & Petrenco, perito em contabilidade e mestre em direito, pesquisador,
autor da Teoria Pura da Contabilidade e suas teorias
auxiliares, doutrinador, epistemólogo, com 49 livros publicados, sendo que
existe livro que já atingiram a marca da 17ª edições.