O split payment, trazido pela reforma tributária,
automatiza a arrecadação e impacta o capital de giro das empresas, exigindo
adaptação tecnológica e jurídica.
A sistemática do
split payment - ou "pagamento fracionado" - é uma das inovações centrais
trazidas pela reforma tributária, introduzida pela EC 132/23 e regulamentada
pela LC 214/25, cuja proposta visa reestruturar o modelo de arrecadação dos
tributos sobre o consumo, substituindo o regime atual por um mecanismo mais
automatizado, com efeitos diretos sobre a gestão financeira das empresas.
Atualmente, a
legislação permite que a empresa receba o valor integral da venda, registre os
tributos incidentes e, apenas posteriormente, efetue o recolhimento aos cofres
públicos. Essa diferença temporal - entre a concretização da operação e o
cumprimento da obrigação tributária - possibilita que muitas empresas utilizem,
ainda que de forma transitória, os valores dos tributos como capital de giro.
Com a introdução do
split payment, essa dinâmica se altera substancialmente. O tributo passa a ser
retido no exato instante da liquidação financeira da operação, ou seja, quando
o valor pago pelo adquirente é efetivamente creditado ao fornecedor do bem ou
serviço. Esse marco temporal, previsto no art. 31 da LC 214/25, é o que aciona
o sistema automatizado que separa os valores correspondentes ao IBS e à CBS,
repassando-os diretamente aos respectivos entes arrecadadores (o Comitê Gestor
do IBS e a Receita Federal do Brasil, no caso da CBS), cabendo ao fornecedor
apenas o recebimento do valor líquido da operação.
Essa modalidade de
recolhimento será operacionalizada por meio de um sistema informatizado,
integrado às notas fiscais eletrônicas e aos meios de pagamento autorizados,
como instituições financeiras, operadoras de cartão de crédito e plataformas
digitais. A retenção dos tributos ocorrerá de forma automática e imediata, sem
depender de ação do contribuinte, com base na diferença entre os tributos
destacados no documento fiscal e eventuais valores já recolhidos por outras
modalidades. Trata-se de um modelo que promove a automação da arrecadação,
amplia a transparência e fortalece o controle da fiscalização tributária.
Importa ressaltar
que o art. 34 da LC 214/25 determina que essa retenção ocorra inclusive nas
hipóteses de pagamento antecipado ou parcelado. Assim, nos casos em que o valor
é adiantado ao fornecedor por uma instituição financeira - como em vendas a
prazo com antecipação de recebíveis -, o recolhimento dos tributos também será
antecipado, com base no momento efetivo da liquidação financeira.
Esse novo modelo de
arrecadação promete ganhos significativos para o Fisco, sobretudo no que se
refere à redução da inadimplência tributária e à mitigação de práticas
fraudulentas. Com os tributos sendo recolhidos de forma automatizada,
elimina-se o risco de o contribuinte se apropriar indevidamente dos valores
tributários. Além disso, a sistemática assegura maior previsibilidade de
receitas aos entes federativos, com arrecadação mais estável e desvinculada das
variações operacionais das empresas.
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Por outro lado, os
impactos sobre a atividade empresarial são significativos. A retenção imediata
dos tributos compromete o capital de giro das empresas, que deixam de contar
com os valores até então disponíveis entre o momento da venda e o vencimento do
imposto. Empresas que operam com margens reduzidas, como aquelas nos setores de
varejo, alimentação, serviços e bens de consumo, serão especialmente afetadas,
dada a elevada frequência de transações e a necessidade constante de liquidez.
Adicionalmente, a
adoção do split payment exigirá investimentos significativos em infraestrutura
tecnológica. As empresas precisarão revisar seus sistemas de faturamento,
gestão financeira, conciliação bancária e emissão de documentos fiscais,
garantindo compatibilidade com os novos layouts exigidos pelas autoridades
tributárias. Essa adequação representa um desafio técnico e orçamentário,
especialmente para pequenos e médios negócios.
Do ponto de vista
jurídico, o novo modelo também impõe mudanças relevantes. A retenção automática
poderá gerar disputas sobre valores indevidamente recolhidos ou divergências na
aplicação das alíquotas, sobretudo nos primeiros anos de transição. Torna-se,
portanto, imprescindível que o ordenamento jurídico contemple mecanismos
eficientes para revisão, contestação e reembolso, evitando a judicialização
excessiva e garantindo segurança jurídica aos contribuintes.
No que se refere à
implementação prática, representantes da Receita Federal, em evento realizado
pela Casa JOTA, esclareceram que o split payment não será obrigatório durante o
ano de 2026, quando se iniciam os testes operacionais da CBS. Nessa fase
inicial, sua adoção será facultativa e restrita às operações entre empresas. A
partir de 2027, o mecanismo será gradualmente incorporado, como parte da transição
para o novo modelo tributário.
Diante desse
contexto, o split payment configura uma medida voltada à modernização da
arrecadação tributária, em consonância com o objetivo de simplificação do
sistema estabelecido pela reforma tributária. No entanto, a efetiva
implementação desse modelo exigirá atenção redobrada do setor produtivo, que
deverá se adaptar às novas exigências operacionais e financeiras.
O setor financeiro,
por sua vez, desempenhará papel central na viabilização da sistemática, sendo
imprescindível que a regulamentação complementar traga diretrizes claras,
consistentes e compatíveis com a diversidade dos meios de pagamento existentes
no mercado brasileiro.
Por isso, é
recomendável que as empresas iniciem um processo interno de adaptação, que
envolva a revisão dos fluxos de caixa, o mapeamento de riscos fiscais, o
investimento em adequação tecnológica e o acompanhamento de uma assessoria
especializada. Compreender os efeitos do split payment será indispensável para
garantir competitividade e conformidade em um cenário tributário em
transformação.
Autores:
- Ana
Lívia Vaz Bisson. Advogada com especialização em Direito Tributário e Sócia da
BBMOV ADVOGADOS.
-Douglas
Santos. Advogado da área tributária.
Fonte: Migalhas / Fenacon