O STF já emitiu
sinais capazes de afastar a apuração de imposto de renda pelo doador.
O art. 23 da lei 9.532/1997 determina a
incidência do IRPF - Imposto de Renda de Pessoa Física sobre a transferência de
bens em adiantamento da legítima, quando efetuada a valor de mercado. Nesta
hipótese, deve ser tributado o ganho de capital correspondente à diferença
entre esse valor e o custo de aquisição declarado pelo doador.
Essa questão será definida pelo Plenário do
STF no julgamento do RE 1.522.312/SC, que teve repercussão geral reconhecida em
abril de 2025 (Tema RG 1.391).
A União sustenta que o caput do art. 23 da
lei 9.532/1997 autoriza o contribuinte a optar pela transferência do bem pelo
valor de mercado ou pelo valor de custo. Por essa perspectiva, se a opção for
pela transferência a valor de mercado, o imposto de renda deverá incidir sobre
a diferença.
Em última análise, busca a União evitar
planejamentos tributários destinados a reduzir ou eliminar a tributação sobre
eventual ganho de capital futuro (alienação pelo herdeiro), que representa
inequívoco acréscimo patrimonial.
Apesar disso, existem dois principais
argumentos capazes de afastar a apuração de imposto de renda pelo doador, ambos
já validados pela 1ª turma do STF no julgamento do RE 1.439.539 AgR/RS.
O primeiro argumento decorre da ausência de
acréscimo patrimonial do doador, que, ao antecipar a legítima, promove a
redução do seu patrimônio. Por essa perspectiva, inexistiria fato gerador do
imposto sobre a renda.
Durante a sessão de julgamento, o ministro
Alexandre de Moraes sinalizou que possui "boa vontade, sempre, com a
Fazenda Nacional, mas há limites". Aos seus olhos, "quem doa não está
ganhando nada, está perdendo patrimônio".
O segundo argumento decorre da vedação à
bitributação, pois o adiantamento da legítima já atrai a incidência do ITCMD -
Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos.
Logo, não seria possível que houvesse a incidência, sobre o mesmo evento, de
dois impostos: IRRF e ITCMD.
Essa compreensão também foi externada pelo
ministro Alexandre de Moraes em seu voto, no sentido de que, "ao exigirem
IR do doador sobre a diferença entre o valor de mercado do bem e o declarado
para o Fisco federal, as normas impugnadas configuram dupla tributação".
Embora o desfecho da questão ainda seja
incerto, os sinais emitidos pela 1ª turma do STF indicam que os contribuintes
podem obter êxito.
Nessa medida, e diante do risco de
modulação de eventual decisão, pode ser oportuno judicializar o assunto, seja
para afastar a tributação sobre futuras doações em adiantamento da legítima,
seja para pleitear a repetição de indébito do IRPF recolhido indevidamente.
Autor:
Aurélio Longo Guerzoni. Sócio do Guerzoni Advogados, com atuação em direito
tributário desde 2008. É especialista (2013) e mestre (2020) em direito
tributário pela FGV/SP.
Fonte:
https://www.migalhas.com.br/depeso/438210/incide-ir-sobre-a-doacao-a-titulo-de-adiantamento-da-legitima